Relato da quarta reunião do GT Participação Social

 

A reunião começou com uma apresentação da Secretaria Nacional de Participação Social (SNPS), órgão vinculado à Secretaria-Geral da Presidência da República, feita pelo secretário-adjunto, Valmor Schiochet.

De acordo com ele, as diretrizes da SNPS seguem os encaminhamentos da transição do governo, implantando três inovações institucionais: o Conselho de Participação Social, com 68 cadeiras; o Sistema de Participação Social, “para garantir que todas as ações tenham participação”; e a Secretaria Nacional de Participação Social, dentro da Secretaria Geral da Presidência da República, que também tem diretorias de diálogos. São elas:  Diretoria de Participação Social; Diretoria de Educação Popular; Diretoria de Planejamento e Orçamento Participativo; e Diretoria de Participação Digital e Comunicação em Rede.

Ele explicou que 2023 foi um ano de reconstrução e “de muita elaboração em torno da política de participação social”, com o plano de trabalho baseado na inovação e ampliação da política de participação com foco em dois elementos estruturantes: educação popular e participação digital.

Segundo Valmor, dentro do Plano Plurianual (PPA) 2024-2027 está prevista a reconstrução das conferências nacionais. O balanço apresentado apontou que foram feitas 116 conferências setoriais nos governos Lula e Dilma anteriores, número que caiu para 11 entre 2017 e 2022, sendo que estas 11 só ocorreram por força legal e resistências de conselhos instituídos por lei, como o de Saúde e o Fórum Nacional de Educação. Com a retomada no governo Lula 3, já estão contabilizadas 19 Conferências Nacionais, entre as cinco já realizadas em 2023, as 11 convocadas para 2024 e outras três para 2025, com participação estimada de 10 milhões de pessoas em todo o processo, desde as conferências regionais preparatórias.

O objetivo da política que guia a SNPS é “promover a participação da sociedade na reconstrução e transformação do país através de instâncias e processos participativos na elaboração, implementação e monitoramento das políticas públicas para o fortalecimento da democracia participativa e representativa”.

O secretário-adjunto apresentou também o balanço da reconstrução dos colegiados nacionais que contam com participação social. De 2019 a 2022, 35 ficaram inativos, foram extintos ou mutilados. No primeiro ano do atual governo, 27 foram reconstruídos e se encontram em pleno funcionamento, dois estão em processo de reativação e outros seis permanecem inativos. Ele afirmou também que 77 colegiados nacionais estão ativos ou em processo de eleição de conselheiros da sociedade civil.

Falou da reconstrução do Fórum Interconselhos, criado em 2011, que fez três reuniões em 2023 no âmbito do PPA participativo, com a participação de 16 conselhos na primeira reunião e 43 na última. Na plataforma Brasil Participativo, foram 4 milhões de acessos e 1,4 milhão de participantes. A metodologia do PPA Participativo envolve todos os ministérios e 76,5% das propostas mais votadas na plataforma foram incorporadas ao Projeto de Lei. Ao todo, 308 propostas foram incorporadas totalmente, 76 parcialmente incorporadas, e 124 não foram incorporadas. “Isso tudo foi o processo de reconstrução que nos possibilitou consolidar o que nós estamos propondo como base da política de participação social”, disse Valmor.

“Percebemos nos últimos anos que essa desconstrução dos mecanismos de participação que ocorreu no nível federal, também ocorreu nos estados e municípios, principalmente nos municípios, vimos essa redução da importância dos conselhos”.

Ele adiantou que a política de participação social nos territórios terá o objetivo de envolver os beneficiários das políticas de forma territorializada. Também houve a decisão de incorporar os processos participativos nos mecanismos multilaterais que o Brasil está comandando, como o G20 e a COP 30.

Valmor afirmou que o governo Identificou e trabalha com quatro iniciativas prioritárias: Programa de participação social com educação popular nos territórios; fortalecimento de colegiados e conferências nacionais; orçamento participativo federal; e plataforma Brasil Participativo.

A diretora-geral da EBC, Maíra Bittencourt, relembrou que, até o momento, o GT conseguiu traçar um panorama do que já existiu em termos de participação na empresa e que, a partir de agora, “começamos a ver as alternativas para o que poderá ser implantado”, como a metodologia de composição desses conselhos e o diálogo com as outras áreas. “No nosso caso estamos mais focados na estrutura da EBC”, afirmou.

O secretário de Participação Social, Renato Simões, explicou que a introdução feita pelo secretário-adjunto teve o objetivo de fazer a “disjuntiva para esse grupo de trabalho”, que é um dos que enfrenta os dilemas da reconstrução.

“O Bolsonaro fez um estrago no sistema de participação social, tentando por decreto eliminar todos os conselhos e conferências. Mas não conseguiu porque os conselhos que se regem por base legal, alguns conseguiram se salvar. Estamos diante de um caso muito sui generis, porque o ato de extinção desse conselho foi anterior ao Bolsonaro. Os que tinham base legal foram mutilados, os que tinham por decreto foram extintos”.

De acordo com ele, o presidente Lula quis recompor os conselhos que foram destituídos por decreto, critério utilizado na maioria dos que foram recompostos. Porém, o Conselho Curador da EBC era instituído por lei e foi um grande avanço servindo como modelo para outras instituições e com mecanismos de efetividade na atuação que eram à época muito avançados.

“Poucas iniciativas tiveram o alcance que o Conselho Curador da EBC teve. Ocorre que, ao se extinguir o Conselho Curador da EBC, se instituiu outro órgão na Lei, o Comitê Editorial e de Programação. Por isso o caso é sui generis, porque não há casos como esse. Porque fazer um decreto é um ato mais simples do que recompor com bases legais. Ficamos nesse dilema entre implantar o comitê da lei ou recompor o conselho extinto”.

Ele lembrou que, em vários conselhos, a SNPS teve uma longa negociação ao longo do ano, com alguns ministérios aproveitando a renovação do decreto para já fazer alterações que avançassem em relação ao decreto anterior. Renato trouxe uma terceira e última experiência, explicando que conselhos “mais pesadões”, que tem caráter normativo, com participação de entes do governo e menor da sociedade, foram encontrando formas de participação social alternativas, como o Fórum Nacional de Educação.

“O Conselho Nacional de Educação não tem paridade, atribuições determinadas. Mas o movimento da educação, entidades sindicais, formataram o Fórum, a conferência foi organizada toda pelo Fórum. O exemplo mais recente, marca desse governo Lula 3, nós temos alguns conselhos que nunca tiveram participação social, como o do Ministério de Minas e Energia, que sempre foi considerado um ministério do Capital e entrava na distribuição de alianças, com o conselho presidido pelo presidente da república e ministros representando o governo. Agora estão definindo a criação de um plano nacional de transição energética, o PLANTE, e vai ter um Fórum Nacional, implantado por decreto com a atribuição de elaborar um Plano”, explicou Renato.

O secretário ressaltou que não existe uma cartilha de como compor um conselho e nem de como atribuir as competências. “Isso se dá com as conversas, embora tenhamos uma equipe de assessoramento técnico. O objetivo é aumentar a qualidade da participação e a efetividade da resposta governamental dentro da pactuação, que faça avançar a política pública”.

O professor Fernando Oliveira Paulino, representante da Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública no GT, agradeceu as falas inspiradoras e lembrou dos desafios não só para as comunicações, mas para as políticas públicas de uma forma geral. Ele pediu um levantamento sistematizado dos comitês e conselhos existentes no poder executivo federal que tenham mecanismos de participação social, nesse “período de entressafra”. “Na pesquisa que a gente fez, encontramos muitos mecanismos que podem ser úteis em entidades que podem ser comparáveis à EBC. Que ideias práticas podem ser levadas à frente na EBC, que tipo de parcerias sugerem para que as iniciativas sejam colocadas em prática. Que tipo de diálogo com o mundo externo a EBC pode fazer para implementar mecanismos e melhorar os existentes, como a Ouvidoria”, questionou.

A presidenta do Conselho Curador cassado da EBC, Rita Freire, destacou a fala da SNPS de que a participação social é uma pactuação entre estado e sociedade. “A gente precisa tomar cuidado na hora de encontrar caminhos, para que esse caminho encontrado contenha potencial de atravessar governos futuros, sempre com aperfeiçoamento”, afirmou. “Precisamos tomar cuidado para não pensar em soluções que em si se desmanchem com uma mudança de gestão na empresa. A participação é fundamental e a participação de dois ministérios no GT vai ajudar a encontrar os caminhos para a EBC. Queremos encontrar um caminho de fato. Nossa ideia é trabalhar junto para ver uma alternativa viável, real, concreta”. Ela, que é a relatora do GT, pediu para que na próxima reunião comecem a ser apresentadas propostas mais concretas e objetivas para a EBC.

Renato retomou a palavra e afirmou que o presidente Lula, nesse governo, colocou uma assessoria de participação social para suscitar a participação social nas políticas públicas de cada ministério. “Antes, era tudo na Secretaria Geral, agora cada política pública precisa ter seu mecanismo de participação social. Nossa pactuação se dá sempre em conversa com cada ministério. Só conseguimos fazer o orçamento participativo porque o Ministério do Planejamento topou. A gente está buscando esses parâmetros por meio de experiências consolidadas”. Ele lembrou que no ano passado não foi possível avançar nos mecanismos para as empresas públicas, nas quais, via de regra, há apenas a eleição de representantes dos trabalhadores e trabalhadoras nos conselhos de administração.

Sobre o Conselho Curador da EBC, Renato destacou que o colegiado era mais amplo, com participação majoritária da sociedade civil. “Outros são tripartite, como o da saúde, com trabalhadores, estado e usuários da sociedade civil, uma experiência mais próxima do Conselho Curador”. De acordo com ele, um dos desafios é ampliar a participação dos usuários dessas políticas públicas, para deixar de ser um pólo mais passivo e passar a ser um pólo ativo na elaboração das políticas. “Quando fala de usuários, a gente normalmente fala de entidades representativas, agora a gente quer avançar para chegar no território. O territorial e o digital juntos podem derrubar a democracia, mas podem fortalecer também,e  é um instrumento negligenciado no Brasil. A EBC é patrimônio da sociedade brasileira e precisa ser fortalecida e preservada”, afirmou.

Rita destacou a importância da reconstrução envolver o território, com as vagas da sociedade civil sendo submetidas a consulta ao conjunto da sociedade, ao conjunto das organizações, caso contrário, “não conseguimos dialogar com as organizações que não estejam representadas no colegiado”. “Outra coisa que não queremos perder é que a sociedade civil tenha um papel protagonista nesse processo. O Conselho estava preocupado com a composição, tudo o que o governo está discutindo hoje, o Conselho já buscava isso. Também não deve ser uma participação simbólica, ela deve ser efetiva e não discutir apenas a EBC, mas toda a rede de comunicação pública”.

Paulino ponderou que a EBC é responsável por um sistema público de comunicação, incluindo emissoras diretamente ligadas e também indiretamente ligadas à empresa, então, é preciso criar um sistema de participação social que encontre o território “lá na ponta”, para estimular que redes universitárias e estaduais também tenham lugar nesse instrumento de participação social.

A ex-conselheira da EBC e assessora da deputada federal Luiza Erundina, Evelin Maciel, lembrou que o decreto que define os critérios para uma emissora participar da Rede Nacional de Comunicação Pública, tem a exigência da formação de conselho e ouvidoria.

A deputada Luiza Erundina, que participa do GT como convidada, se disse entusiasmada e otimista com a exposição feita pela SNPS, de uma política construída com vista em trazer a sociedade civil para construir os rumos do que o governo define para levar à sociedade. “Temos hoje uma base do lado do governo mais construída e pensada em promover essa política de participação social. E o governo tem condições de incorporar a participação da cidadania, mas pra que ela seja efetiva, tem que ter a vontade da sociedade civil de participar e se colocar”, falou.

Sobre a EBC, a deputada registrou o esforço dos membros do Conselho Curador, “que se mantiveram articulados e resistindo, não aceitaram a destruição que fizeram na empresa e debatendo as ideias”. De acordo com ela, é preciso aproveitar o momento para se reconquistar aquilo que se perdeu, mas também para avançar. E lembrou da necessidade de se fazer a 2ª Conferência Nacional de Comunicação. “Tá na hora de se pensar em uma segunda conferência, que precisa vir das bases da sociedade, nesse processo de reconstrução. Não podemos ceder em nada do que já foi alcançado. Precisamos fortalecer as lideranças dos movimentos populares”. E afirmou que o “filhote da primeira conferência de comunicação” é a Frente Parlamentar pelo direito à comunicação, atualmente inativa.

Representante da Secom no GT e vice-relator, Octavio Pieranti perguntou se a SNPS tem o detalhamento de participação social em conselhos de outras empresas públicas e se elas têm outras instâncias de participação, como ouvidorias.

O representante dos sindicatos dos Jornalistas, Pedro Rafael Villela, disse que a apresentação foi bastante elucidativa e ajuda a “abrir a cabeça”. Ele reiterou que o papel do GT é pactuar um formato de participação na EBC e que, diante disso, é preciso analisar outras possibilidades de retomada de algum mecanismo que não seja regido por lei, olhando para o cenário concreto da empresa. “Estamos diante de um impasse. Pela lei, manteve o comitê, mas sem competência prática, com apenas duas e inócuas. Mas a própria lei determina que o comitê seja regulamentado por decreto. Até que ponto podemos restituir as atribuições ou se é possível criar outras estruturas por decreto”, questionou.

A representante da Comissão de Empregados da EBC, Akemi Nitahara, perguntou se a Secom e a SNPS já abriram diálogo sobre a participação na EBC, já que a Secom vem insistindo no sentido de implementar o Comitê da Lei e diz que as pautas dos trabalhadores para dar alguma autonomia editorial à EBC são corporativistas, enquanto a SNPS apresentou que vem dialogando com os diversos ministérios para avançar nas políticas de participação social. “Estamos selando agora essa conversa?”, ponderou.

Renato respondeu que a partir das experiências da participação de trabalhadores e da sociedade, não existe nada parecido com o que teve na EBC. Mas que, desde o ano passado, a SNPS começou a trabalhar a participação social na elaboração dos Planos Nacionais, como o de clima e mitigação com o Ministério do Meio Ambiente, e o da transição energética, “a ideia é que esses planos entrem na participação presencial e digital”, afirmou. “Queremos substituir as audiências públicas pela plataforma Brasil Participativo, que pode ser usada para minutas de decreto, dentro do plano Participa Mais Brasil”, explicou.

Renato disse que a Secom tem uma assessoria de participação social que participou de todas as instâncias de implementação da plataforma, mas que a relação para discutir a participação social na EBC se dá através desse grupo. 

“Para contribuir e não atrapalhar, minha opinião é que a forma como o Comitê Editorial foi normatizado pela Lei, não tem uma pálida imagem do que foi o Conselho Curador. Então, podemos dizer que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. A Secom pode tomar uma chamada do TCU porque não regulamentou o Comitê”, disse Renato.

De acordo com ele, a EBC pode aproveitar os mecanismos da SNPS, para fazer, por exemplo, uma consulta ou um seminário. “Ele é por adesão e tem alguns condicionantes, mas a força do Conselho Curador é a força da lei. É melhor esse caminho da pactuação entre os entes, que são livres para aderir, e a Secom ou a EBC propõe o que considera relevante. Não vamos obrigar nada por decreto”, afirmou o secretário.

Como caminhos que podem ser seguidos para retomar a participação social na EBC, Renato elencou: projeto de lei alterando a lei e reincorporado o Conselho, com uma análise de correlação de forças no Congresso, “eu tenho sido bem conservador nesse aspecto, mas nada impede que se mande, mas em geral os projeto sobre participação tem saído piores do que os mecanismos que existem atualmente”; fazer por decreto, pode não ter capacidade de restaurar todas as funções do conselho, porque regulamenta o que já está na lei, “nesse momento, eu abriria uma discussão pública, mas não encaminharia para o Congresso Nacional, esperaria para ver a composição das comissões da Câmara antes de mandar qualquer proposta legislativa”.

“A gente quer institucionalizar até o fim do governo Lula muitas destas conquistas. Precisa ter lei pra fazer conferência? Não. Precisa estar em lei pra ter o conselho? A prática mostrou que sim, porque os que se mantiveram foram os que estavam em lei. Minha visão: implementar o comitê editorial com a melhor regulamentação possível é uma obrigação, está na lei. Isso não impede de continuar discutindo outras formas de participação. Podem fazer um arranjo desse tipo: regulamenta com boas portarias o Comitê e faz por outras formas algo com as atribuições do Conselho”, concluiu Renato.

Fechando a reunião, Maíra disse que pontuou nove linhas de ação que podem ser estudadas, como as propostas que tem sido levantadas em conferências, conselhos, fórum interconselhos, plataforma Brasil Participativo, conferência pela plataforma, frente parlamentar e a implementação do Comitê Editorial da melhor forma possível.

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