A reunião conjunta do Comitê de Participação Social, Diversidade e Inclusão (Cpadi) e do Comitê Editorial e de Programação (Comep) ocorrida no dia 26 de novembro prosseguiu com os convidados para apresentar os diversos aspectos da empresa aos conselheiros.
O convite foi feito pela presidenta do Cpadi, Ana Fleck, ao advogado Luís Henrique Martins dos Anjos, que trabalhou na organização da consultoria jurídica da EBC em 2008 e foi Procurador Geral da União no governo Lula 2, sendo advogado da União de carreira.
Antes da exposição de Luís, o diretor-geral, Bráulio Ribeiro falou sobre o trabalho realizado pela EBC na COP30. De acordo com ele, como emissora anfitriã do evento foram cerca de 220 pessoas envolvidas na transmissão dos 42 sinais simultâneos, mais 110 trabalhando na cobertura jornalística do evento para os veículos públicos e governamentais. Foi apresentado um vídeo institucional destacando o trabalho.
O conselheiro Isaías Dias questionou a falta de acessibilidade no vídeo, pois era composto apenas por imagens e música, sem a audiodescrição para as pessoas cegas.
O presidente do Comep, Pedro Rafael Vilela, que foi um dos repórteres da Agência Brasil no evento, elogiou a estrutura montada. “A sensação que a gente tinha lá era que parte da empresa foi transferida pra lá, com links, colegas da área meio, deu um orgulho danado, mostrou a relevância da EBC. Foi uma experiência enriquecedora e todo o trabalho foi muito bem conduzido, bem planejado e executado”.
A conselheira Akemi Nitahara elogiou a cobertura jornalística feita pela Rádio Nacional e pela Agência Brasil, que conseguiu fugir do oficial e mostrar outros aspectos do evento, com eventos paralelos e espaço para vozes pouco escutadas na grande mídia. E perguntou qual foi o custo dessa operação e quem pagou por ela, já que a EBC “não tem dinheiro para nada, mas quando interessa a verba aparece”.
Bráulio explicou que todo o custo da COP30 foi pago pela Secretaria Extraordinária da COP30, órgão criado no ano passado dentro da Casa Civil, incluindo a cobertura jornalística.
“Nós não precisamos utilizar recursos próprios pros jornalistas que foram, de passagem, diárias, alimentação, hospedagem. O contrato como emissora anfitriã era só pra parte oficial, mas pedimos verba pra cobrir também o jornalismo. O custo de R$1,5 milhão para a cobertura e R$ 27 milhões para a prestação de serviço como emissora anfitriã. Recebemos um TED da SECOP pra EBC. Se não fosse isso, não teríamos condições de fazer a cobertura robusta que fizemos”.
A conselheira Juliana Doretto perguntou sobre os planos da empresa para a continuação da cobertura, “já que o Brasil fica na presidência por um ano”. Bráulio explicou que há a intenção de se produzir um documentário “para mostrar de forma mais didática os resultados da COP”, mas que ainda não tem o planejamento estabelecido.
A conselheira Cibele Tenório elogiou a participação da Rádio Nacional da Amazônia na COP30. “Tivemos a Mara Régia na COP, foi um golaço, ela fazer os programas diários de lá. A rádio funciona de Brasília, raramente temos a oportunidade de fazer programas da Amazônia. Não existe mais equipe de jornalismo da Nacional da Amazônia, então foi muito importante ter a Mara lá”.
Cibele também questionou uma presença exagerada da primeira dama Janja em uma entrevista ao vivo no telejornal Repórter Brasil Noite, com a jornalista Cristina Serra. “O tema era importante, discutir mudanças climáticas e como afetam as mulheres. Mas foi dado um espaço desproporcional, a entrevista durou mais de 10 minutos num telejornal de 30. Se isso acontecesse em outros governos a gente acharia um absurdo. Temos sempre que lembrar o nosso objetivo como veículo público, parecia o Canal Gov. Não podemos perder esse radar de alerta que nos guiou nos últimos anos. Caberia até um programa maior e melhor no Gov, mas não podemos perder o nosso caráter público”.
A ouvidora Roberta Dante ressaltou que esse aspecto foi apontado pela ouvidoria nos boletins encaminhados à diretoria. “Se tivesse abordado de outra forma, poderia ressaltar o caráter público, ela entregou uma carta sobre a visita aos seis biomas. Nós fizemos a observação e endereçamos para a diretoria”.
Financiamento e modelo jurídico
Passando à exposição de Luís Henrique, ele destacou que estava como Procurador Geral da União na ocasião da criação da EBC, mas que a decisão sobre o modelo jurídico da empresa já estava decidido quando chegou para ele emitir um parecer a respeito.
“Pra mim, como PGU naquele momento, chegou pra mim uma decisão pronta, que seria uma estrutura só, que iria incorporar a Radiobrás, já estava decidido, eu não pude contribuir mesmo tendo coisa melhor pra se fazer”.
De acordo com ele, a proposta previa que a EBC teria um aporte inicial de recursos da União no primeiro ano de existência e depois se tornaria uma empresa pública não dependente do Tesouro, “sendo dependente não tem como dar certo”. Os recursos próprios viriam da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública (CFRP), que foi criado separando 5% dos recursos do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), pago pelas empresas de telecomunicações e administrado pela Anatel.
A CFRP foi criada sem aumentar a carga tributária, mas como houve questionamento judicial por parte das empresas de telecomunicação, que argumentaram estar financiando com a contribuição uma atividade alheia à delas, no caso a radiodifusão, o dinheiro não entrou para a EBC e ela não conseguiu se tornar não dependente do Tesouro.
“A EBC foi concebida para receber recursos do Tesouro, mas a maior parte do financiamento do custeio, ou seja, tudo o que não é investimento, seria paga com recursos próprios, oriunda dessa contribuição criada por emenda parlamentar, que entraria carimbado para o orçamento da EBC, com 75% da CFRP para a EBC, 22,5% para as emissoras parceiras e 2,5% para a Anatel. Haveria contratos de prestação de serviços a terceiros, poderia vender serviços e produtos e daí viriam recursos próprios, além de doações, como no modelo dos Estados Unidos”, explicou Luís.
Luís explicou que outro problema foi um parecer, segundo ele equivocado, por parte da área econômica do governo, que não enquadrou a CFRP como fonte própria da EBC. “Mas é só um parecer jurídico, quem dá o parecer é a AGU, a CFRP não era pra ser fonte Tesouro, é pra ser recursos próprios”. Segundo ele, mesmo se a empresa for não dependente, os investimentos podem continuar como responsabilidade do governo. “Mas a EBC nunca conseguiu dar essa virada de chave pra ser não dependente”.
Outra opção de modelo jurídico, de acordo com Luís, seria o de Serviço Social Autônomo, desde que não seja vinculado a nenhum ministério, com orçamento parafiscal vindo da CFRP. “O funcionamento burocrático não é o mesmo de uma autarquia ou empresa pública. O regime é celetista, com a forma de ingresso similar ao concurso, mas menos rigoroso, licitação também pode ser menos rigoroso. Existem possibilidades, mantendo dentro dos controles que tem que ter, mas os mecanismos são mais flexíveis”.
A última alternativa apresentada por ele foi a brecha da Reforma Administrativa, que está em discussão, e pode ser aproveitada para mudar o status dos órgãos na legislação sem precisar focar apenas na comunicação pública. De acordo com Luís, atualmente a administração pública é regida pelo Decreto-Lei 200, de 1967, ou seja, uma lei da ditadura militar.
“A lei da organização da administração pública que está em vigor foi feita no governo militar, em 1967, era avançada pra época. Essa lei cria o que são a autarquia, a empresa pública, a fundação, define as configurações jurídicas da administração pública. Então seria criar uma configuração jurídica para a comunicação pública. É uma solução também para as universidades, que às vezes usam uma fundação de apoio, um departamento, poderia ter um modelo de comunicação pública pra todos os níveis, uma norma geral para tudo de comunicação pública”.
Luís explicou que isso seria uma solução nacional que cria facilidades operacionais, embora não resolva o financiamento. E citou modelos europeu onde tem comunicação pública, no qual o Estado é dividido em seis poderes, e não três como no Brasil. “Tem uma função de administração pública separada da função governamental, isso ajuda muito as estruturas não estatais a desempenhar a função pública, já que quando muda o governo não cai tudo. A Corte Constitucional é separada do judiciário, as funções de controle são separadas do legislativo. Aqui temos tudo misturado e mais concentradas as funções do Estado”.
A conselheira Roseli Biage falou sobre o modelo da TV Cultura de São Paulo, onde trabalhou. “A TV Cultura ainda faz captação no mercado, não é Lei Rouanet, a EBC pode pensar nisso, nesse modelo público-privado com atenção, porque isso ajudou muito a gente a não sofrer intervenção. Tem que ter autonomia dos órgão de gestão, pensar na fundação público-privada, uma legislação que a gente consiga não ter mudança de gestão e tudo o que vimos acontecer”.
Luís explicou que a TV Cultura tem uma solução jurídica que tem precedentes no Tribunal de Contas e no Tribunal de Justiça de São Paulo, com um modelo híbrido, mas que na esfera federal não é aceito pelos órgãos de controle. “Depois que deixei de ser Diretor Jurídico da EBE eu atuei na liberação de projetos para captação de recursos, mas isso não foi pra frente porque todo esse dinheiro captado entra para o Tesouro. Se for uma empresa pública não dependente poderia entrar para a EBC”.
Bráulio lembrou da necessidade de se olhar para como a empresa funciona hoje, para depois tentar uma solução jurídica. De acordo com ele, atualmente as fontes de recursos da EBC são a União, a CFRP, publicidade institucional, e a prestação de serviços de comunicação, basicamente à Secom. “A prestação de serviço é a mais complicada, porque é difícil que sobre alguma coisa pra gente. Para prestar serviço, precisa aumentar a estrutura e prestar o serviço, não sobra nada de lucro”.
Ele explicou que os recursos da CFRP têm entrado para a EBC, na ordem de R$220 milhões por ano, incluindo os 22,5% que deveriam ser destinados à RNCP, já que não houve regulamentação para a contribuição. O problema, segundo Bráulio relatou, é que o limite orçamentário é único e o que entra pela CFRP, o Tesouro retira dos repasses para a EBC. Além disso, o montante de R$ 3 bilhões que estavam represados por causa da judicialização foi utilizado pelo governo para outros fins na época da pandemia de Covid-19.
“Na publicidade temos muitas amarras, não podemos buscar recursos de publicidade comercial, mas precisa destravar essa compreensão, já que é uma receita boa, ela não exige que a gente produza nada mais, a gente comercializaria o que já temos, que é tempo na grade”.
O diretor-geral também explicou que o orçamento da EBC é dividido em custeio, folha e investimento, sendo que este último não tem nenhuma verba. “A folha vai chegar a R$600 milhões por ano, o custeio basal está em R$160 milhões. Nosso desafio é entender que temos um custo de quase R$800 milhões por ano, onde vamos conseguir isso sendo não dependente?”.
De acordo com ele, o orçamento da BBC é de 5 bilhões de libras esterlinas, sendo 80% proveniente da taxa paga pelos cidadãos diretamente para a empresa. Ou outros 20% vêm dos negócios próprios. “Aluguel de estúdio, venda de conteúdos, captação, prestação de serviços da BBC parlamento. Imagina a gente? Quanto a gente conseguiria?”
Luís Henrique lembrou que a EBC já vendeu espaço na grade, incluindo para a iniciativa privada, além de serviços como as Loterias da Caixa, “basta manter a equidistância do mercado e do Estado”, segundo ele. “Eu fazia análise disso e liberava. A gente conseguiu fazer publicidade institucional em ano eleitoral. A ideia para a EBC era ser um terço de financiamento do tesouro, um terço da contribuição e um terço de negócios”.
Cibele lembrou que no início de 2023, com a gestão de Kariane Costa, a foi proposto ao Banco do Brasil e à Caixa para venda de espaço, incluindo a transmissão da loteria. Mas todos os departamentos jurídicos concluíram que não seria possível.
Ouvidoria
A ouvidora Roberta Dante fez um relato sobre o trabalho de análise de conteúdos que começou a fazer, mas lembrou que por uma questão burocrática ainda não pode divulgar amplamente, sendo encaminhados apenas para as diretorias. Trata-se da Deliberação 12/2021 do Conselho de Administração da EBC, que proibiu o órgão de divulgar as análises de conteúdos nos relatórios bimestrais. Mas desde o relatório anual de 2022 a seção das análises do ombudsman parou de ser publicada.
“A gente enxerga um pouquinho da Ouvidoria nessas pinceladas. Ao mesmo tempo da cobertura da COP30 a gente teve a ação no Rio de Janeiro. A gente ressalta a importância da profundidade, de ir in loco, de ouvir a população. Três semanas depois tivemos o Caminhos da Reportagem muito sensível. Teve o relatório do Derrite, destacamos a importância de falar de quem é essa pessoa, mostrar mapas, decifrar siglas e códigos. Hoje a gente traz esse resumo pros Comitês saberem como a Ouvidoria está atuando”.
Sobre a COP, Roberta informou que a entrevista com a primeira dama foi alvo de análise e a Ouvidoria também apontou a utilização excessiva de stand-ups na TV Brasil, no lugar de VTs elaborados para os telejornais. “No decorrer dos dias a gente foi vendo uma mudança de postura, a gente se sentia útil”, falou.
O ouvidor adjunto, Ricardo Melo, complementou que, apesar de estar a pouco mais de um mês na Ouvidoria, traz a experiência acumulada na empresa da época que foi diretor de jornalismo e diretor presidente, entre 2015 e 2016.
“A Ouvidoria vem fazendo o trabalho para que a empresa possa avançar. A Ouvidoria é uma interface com os setores da empresa, o contato entre quem produz e quem recebe o que é produzido. A gente está agregando a esse papel fundamental da Ouvidoria, que é o contato com o cidadão, uma tentativa de fazer uma análise periódica, talvez semanal, sobre a cobertura, com ênfase no jornalismo, mas é impossível ver tudo. Para contribuir no curso do trabalho de reconstrução da EBC, porque na época do Bolsonaro a EBC foi transformada num megafone da turma golpista”.
Câmaras temáticas
A presidenta do Cpadi, Ana Fleck propôs a criação de câmaras temáticas para os comitês se debruçarem sobre assuntos específicos, com as sugestões de: Acessibilidade; Raça e Etnia; Cidadania, Gênero e DIreitos Humanos; Programação infanto-juvenil; Cinema e Dramaturgia; Cultura digital; e financiamento.
Após debates sobre se seria melhor o formato de discutir estrutura e programações ou temas específicos nas câmaras, ficou decidido debater a questão fora das reuniões para decidir na próxima, marcada para 17 de dezembro. Para esta reunião, está prevista a apresentação da diretora de Conteúdo e Programação, Antonia Pellegrino. E para janeiro será agendada uma reunião com a participação do superintendente de Comunicação Digital e Mídias Sociais (Sudin), Fernando Miranda.
Juliana Doretto informou sobre a reunião que teve com a equipe técnica da EBC para tratar do site da participação social, que já começou a ser construído e estão sendo feitas melhorias. De acordo com ela, foram feitas sugestões e ficaram duas pendências.
“Hoje e a gente tem uma cobertura das atividades dos comitês feita pela equipe de comunicação institucional, que não são muito detalhadas, não aparecem as tensões que surgem nas reuniões. As nossas atas também ficam muito sintéticas. Então, talvez usar o espaço do site como um registro das nossas discussões. Temos que pensar como queremos comunicar essas reuniões e como a gente quer gerir esses processos. Pensei que podemos elaborar textos próprios pra destacar o que a gente quer das reuniões. Outra coisa é ter um espaço para divulgar nas redes e usar o site como um canal de comunicação com o público”.
Por fim, a assessora de Participação Social, Eloísa Galdino, informou que não havia ocorrido inscrições para o processo de eleição suplementar para o Comitê Editorial e de Programação, que ficou com três vagas em aberto: Cursos superiores de comunicação social, Comunidade cultural e Entidades de defesa dos direitos humanos e das minorias. Portanto, as inscrições foram prorrogadas até o dia 5 de dezembro.
Ela também informou que, apesar do GT sobre a Ouvidoria não ter sido implementado, o trabalho do órgão “está caminhando para o que a gente entende o que deve ser a Ouvidoria no Sinpas”. Também informou que está previsto para maio três eventos consecutivos, a ocorrer no Rio de Janeiro, para comemorar os 90 anos da Rádio Nacional, com a comemoração em si, o encontro da RNCP e um evento acadêmico.
