Objetivo é exercer a participação social extirpada da comunicação pública
A Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública lança nesta quarta-feira (16) o primeiro relatório da Ouvidoria Cidadã da EBC. O objetivo do projeto é analisar conteúdos publicados e veiculados pela Empresa Brasil de Comunicação com o olhar dos princípios da comunicação pública, que deveriam orientar a produção da TV Brasil, das rádios Nacional e MEC, da Agência Brasil e da Radioagência Nacional, bem como os perfis desses veículos nas redes sociais.
A medida se faz necessária pelo fim dos mecanismos de controle social que existiam na empresa e que tornavam a EBC uma empresa de comunicação pública de fato. Desde o golpe de 2016, o desrespeito à Lei nº 11.652/2008, de criação da EBC, vem se intensificando, como detalha a ex-presidenta do Conselho Curador da EBC, Rita Freire.
“A EBC perdeu seu caráter de comunicação pública quando desfez os instrumentos de participação. A Ouvidoria perdeu seu papel crítico. O Conselho foi desfeito. O governo apoderou-se de toda gestão e passou a interferir nos conteúdos. Uma Ouvidoria Cidadã poderá cumprir um papel inestimável de observatório, documentação, denúncia e pressão no diálogo com a sociedade sobre o uso político atual e o destino do projeto EBC”.
O professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo (ECA/USP) e primeiro Ouvidor-geral da EBC, Laurindo Lalo Leal Filho destaca a importância da Ouvidoria para uma empresa de comunicação pública.
“A Ouvidoria é parte inseparável da estrutura de uma empresa de comunicação pública. É o canal institucional que permite a participação do público na elaboração das políticas editoriais da empresa. Para isso é fundamental que ela tenha total autonomia de ação, balizada apenas pelas leis e regulamentos que regem a instituição pública. É igualmente importante que a Ouvidoria se relacione com um Conselho Curador, inerente a uma empresa pública, levando a ele as sugestões e demandas vindas da sociedade. A Ouvidoria é a janela aberta pela comunicação pública ao público que a utiliza e a mantém”.
Professor de jornalismo da Universidade Federal Fluminense e especialista em agências de notícias, Pedro Aguiar explica que, no Brasil, o uso da comunicação pública para propaganda governamental remonta a estados autoritários.
“A confusão entre comunicação pública e divulgação governamental não é nova no Brasil. Tem raízes em períodos autoritários da nossa história, em particular na ditadura militar, quando oficiais com experiência em relações públicas foram deslocados para dirigir a Agência Nacional, uma das antecessoras da EBC. É uma visão em tudo incompatível com a democracia. A ouvidoria cidadã, portanto, é uma salvaguarda democrática para cobrar que o investimento público em comunicação seja feito no interesse público, e não do governo”.
Rita, Lalo e Pedro integram a Frente em Defesa da EBC, formada por entidades da sociedade civil, de defesa da democratização da mídia e grupos acadêmicos, além de jornalistas e pesquisadores.
A Ouvidoria Cidadã da EBC publicará análise dos conteúdos, boletins e artigos, que serão reunidos em relatórios periódicos, apontando veiculações e publicações em desacordo com os princípios previstos na lei e também exemplos de bons conteúdos que promovem o debate público de ideias e a circulação de informações preconizadas pelas boas práticas internacionais de Comunicação Pública.
Neste primeiro relatório, foram abordados, de forma amostral, conteúdos de 2020. As contribuições com críticas, elogios, prints, links ou análises de conteúdos da EBC podem ser enviadas para o e-mail ouvidoriacidadaebc@gmail.com. O material será publicado ao longo do ano nas redes sociais da Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública (https://pt-br.facebook.com/emdefesadaEBC/).
Desmonte da participação social na EBC
Como primeira intervenção na empresa, o governo Temer, ainda provisório, tentou destituir o diretor-presidente da EBC, Ricardo Melo, que tinha mandato e conseguiu uma liminar para permanecer no cargo. Após o afastamento definitivo de Dilma Roussef, foi editada a Medida Provisória 477, que acabou com o mandato do diretor-presidente da EBC e com o principal mecanismo de participação social na empresa: o Conselho Curador.
Com isso, a EBC perdeu a pouca autonomia editorial que tinha e a sociedade civil foi retirada das instâncias oficiais da empresa, já que o Conselho Curador era formado por maioria de membros escolhidos por meio de consultas públicas e tinha como principal função garantir que os interesses da sociedade estivessem representados nos conteúdos da empresa.
Em 2018, a Ouvidoria da EBC, que fazia a análise crítica e independente dos conteúdos dos veículos públicos, mudou de rumos e passou a cumprir um papel de comunicação institucional. Os relatórios não trazem mais avaliações sobre o que é colocado no ar. No lugar das análises e manifestações da audiência, os documentos passaram a trazer muito autoelogio à “nova gestão” da Ouvidoria e da Empresa. Num processo de burocratização do acesso da população ao órgão, a Ouvidoria da EBC passou a integrar o portal oficial das ouvidorias de todos os órgãos do governo federal, o Fala.BR.
SERVIÇO:
Lançamento da Ouvidoria Cidadã da EBC
Dia 16/12 (quarta-feira), 19h
Debatedores:
Laurindo Leal Filho – Professor da ECA/USP e 1º Ouvidor-geral da EBC
Rita Freire – Jornalista, ex-presidenta do Conselho Curador da EBC
Pedro Aguiar – Professor de Jornalismo da UFF
Juliana César Nunes – Sindicato dos Jornalistas DF e Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira)
Mediação: Akemi Nitahara – Comissão de Empregados da EBC
Disponível em:
Participação de Fernando Oliveira Paulino – Professor da UnB e Coordenador do Laboratório de Políticas de Comunicação (LaPCom) e da Rede Nacional de Observatórios da Imprensa (RENOI):