A EBC e a comunicação pública estão em alta nas rodas acadêmicas. Começou esta semana o Ciclo de Debates “O presente e o Futuro da Comunicação Pública”, promovido pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília e pelo Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho (Portugal).
A primeira sessão, ocorrida no dia 4 de abril (https://www.youtube.com/watch?v=j6F36_sQt50), contou com a participação de Felisbela Lopes (CECS/UMinho), Wellington Almeida (EBC/ Universidade de Brasília) e Kariane Costa (EBC/ Universidade de Brasília), a presidenta interina da EBC no primeiro mês do novo governo.
Sobre a separação entre a TV pública e a TV governamental, que não ocorreu até agora, prestes a se completar 100 dias de governo, tanto Kariane quanto Wellington foram enfáticos em que isso vai acontecer. Porém, sem nada concreto até o momento.
“É claro que a gente sempre fica com um fantasma de ser usado como instrumento de propaganda política, como aconteceu. Principalmente nos últimos seis anos, né? É uma Utopia [essa separação]? Eu diria que é um Desafio. Mas para fazer acontecer, existem vários passos. Estamos há pouco menos de três meses com a gestão nova e estamos indo nesse caminho. A diretoria, a macroestrutura, já foi apresentada, a gente vai ter a separação, a volta de uma Diretoria para o jornalismo público e a gente vai ter uma Superintendência para cuidar de serviços [ao governo]. Esse é o primeiro passo”, garantiu Kariane, que agora é assessora da presidência da EBC.
Também assessor da presidência, Wellington afirmou que o objetivo da gestão é “construir mesmo uma comunicação pública”, dentro do desafio e da luta histórica que envolvem a questão.
“A gente vai ter mais comunicação pública, mais independência, na medida que a gente aprofunde a democracia. Não tem como não ter isso, não é uma questão normativa, é uma questão de contexto político, de compreensão da perspectiva democrática. No meu modo de ver, ela tem que alcançar todas as forças políticas, inclusive as forças de esquerda. É um debate que vai muito além de uma certa polaridade entre democráticos e não democráticos, né? Falando especificamente das perspectivas, a gestão começou a desenhar e vai ter uma clara separação. Já tinha uma separação na criação [da EBC], né? E depois acabou, então vai ter a Superintendência do governamental, a gente tem dois sinais, eles vão se separados, pensando um pouco na TV, né? Acho que isso é importante.”
Conselho Curador
A retomada do Conselho Curador para dar as diretrizes para a comunicação pública feita pela EBC também foi tratada no ciclo de debate. Porém, segundo Kariane, ainda sem solução no curto prazo.
“A comunicação pública é a voz da sociedade civil. Então, sem Conselho Curador hoje, deixa a gente vulnerável até a possíveis interferências do governo dentro da EBC. Também dá mais garantia a questão do mandato presidencial, a gente não pode ficar à mercê de que uma atitude ou outra de um presidente da nossa empresa desagrade e ele seja retirado, como a gente viu no passado e isso foi um desastre. Isso não dialoga com a comunicação pública. Então, uma das principais reivindicações não só dos trabalhadores da EBC, mas da sociedade civil e de quem acompanha a discussão da importância da comunicação pública no Brasil e no mundo é a volta do Conselho Curador. Essa pauta ainda está no governo, ainda está em discussão e a gente está na expectativa que isso se concretize.”
Wellington destacou que a questão pode enfrentar dificuldades no Congresso Nacional.
“Eu acho que há o compromisso muito claro da atual gestão de que tem que retomar uma governança que não está estruturada, o próprio Conselho de Administração ainda não foi renovado, ela tem obviamente que incorporar fortemente a sociedade civil agora. Mas tem o contexto político, passa pelo governo articular a medida provisória ou um projeto de lei e vai ter que ir ao Congresso. Eu acho que para além da EBC, o governo tem um cuidado imenso hoje com qualquer medida provisória. Tem que ter sempre o olhar para a governabilidade, ainda em construção do ponto de vista legislativo. A vitória foi muito apertada eleitoralmente e você tem um grupo conservador muito forte. Então, na minha leitura, essa questão ainda não andou porque não é só em relação à EBC, outras questões também prementes para o governo demandam articulação no Congresso e esse processo é uma construção do ponto de vista político mais geral, né? Mas eu tô de acordo com essa questão da pluralidade. A gente vai ter que restituir a cidadania e construir credibilidade”.
Enquanto não há solução a caminho para restaurar os princípios da comunicação pública na EBC, com separação clara da comunicação de governo e participação social, esta Ouvidoria Cidadã tem uma sugestão: instalar imediatamente o Comitê Editorial e de Programação previsto na lei da EBC, mudança introduzida pelo Congresso Nacional após o desmonte de Michel Temer:
“Art. 15. O Comitê Editorial e de Programação, órgão técnico de participação institucionalizada da sociedade na EBC, terá natureza consultiva e deliberativa, sendo integrado por onze membros indicados por entidades representativas da sociedade, mediante lista tríplice, e designados pelo Presidente da República. (Redação dada pela Lei nº 13.417, de 2017)”
Lembrando, ainda, que o juiz federal Antonio Henrique Correa da Silva, da 32ª Vara Federal do Rio de Janeiro, determinou a imediata instalação do órgão, em decisão de outubro de 2021, em resposta a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal.
“Como visto a instituição e manutenção do Comitê Editorial e de Programação constitui elemento essencial à garantia de independência frente aos interesses propriamente governamentais na definição da programação da TV pública em questão, contribuindo, em todos os níveis, para a efetivação e democratização do direito à comunicação em seu mais amplo espectro. O caráter plural e representativo de tal órgão é o que garante a formulação da programação sem a prevalência da influência de determinado grupo social ou visão de mundo, conferindo concretude ao princípio da pluralidade de fontes de produção e distribuição do conteúdo”, diz a decisão.
Apesar de semi-figurativo, a instalação do Comitê já seria um começo.