A Comissão de Empregados da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e os Sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas do Distrito Federal, do Rio de Janeiro e de São Paulo apresentam a 4ª edição do Dossiê de Censura e Governismo.

O documento foi elaborado a partir de denúncias registradas pelos empregados em formulário online, entre agosto de 2021 e julho de 2002 e faz parte do conjunto de esforços das trabalhadoras e dos trabalhadores, ao lado da sociedade civil, em defesa da comunicação pública e da própria EBC. Mais uma vez, o levantamento mostra que os casos de censura e de governismo se instalaram em todos os veículos públicos da EBC: Rádio Nacional, Rádio MEC, TV Brasil, Agência Brasil, Radioagência Nacional e as respectivas redes sociais.

O dossiê contabilizou 64 denúncias de censura, 228 de governismo e mais 274 interrupções da programação da TV Brasil para exibição de eventos de interesse do presidente Jair Bolsonaro. Neste levantamento, apresentamos também a categoria “pautas irrelevantes”, que somaram mais de 200 denúncias. Entendemos ser importante destacar esse tipo de conteúdo por ele configurar um expediente que se tornou comum na EBC: ocupar as equipes com a produção de reportagens e conteúdos sem importância para a sociedade nem interesse público, de forma que os trabalhadores ficam sem tempo para tocar conteúdos de maior qualidade. Como exemplo, foram registradas pautas como dia do chocolate, o dia da batata frita e o dia do cuscuz, o episódio de uma vaca flagrada descendo por um tobogã e a divulgação da areia sustentável da companhia Vale.

Lembramos que nem todos os casos são denunciados, portanto o documento apresenta uma amostragem significativa de casos em diversas áreas, na programação jornalística e de entretenimento.

Essas situações evidenciam que, sem as instituições de controle e participação social previstas originalmente na Lei de Criação da EBC 11.652/2008, o governo encontra terreno livre para implantar mudanças que afastam a EBC do conceito de comunicação pública e a aproxima da governamental. A sociedade fica, mais uma vez, alijada de um dos sistemas previstos na Constituição Federal (Artigo 223) para promover e fomentar a pluralidade, a diversidade e a cidadania.

Lembramos que a radiodifusão pública é considerada um referencial para sociedades democráticas consolidadas, de acordo com  a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e outros organismos internacionais. Nos seus Indicadores para o Desenvolvimento da Mídia, de 2010, a Unesco destaca ainda o modelo público como um dos componentes vitais para um sistema midiático plural, livre e independente nos países.

Às vésperas de eleições, é importante destacar, portanto, a necessidade de as candidaturas ao Palácio do Planalto e ao Congresso Nacional se comprometerem com a matéria e com a reconstrução dos mecanismos que assegurem o caráter público da empresa de comunicação, notadamente, o Conselho Curador, o mandato de presidente da EBC e com a liberação dos recursos da Contribuição de Fomento à Radiodifusão Pública (CFRP) diluídos no Tesouro Nacional.

É um dos desafios da nossa frágil e jovem democracia garantir espaço equilibrado para o exercício das liberdades de imprensa e de expressão. Para atender ao direito à informação dos cidadãos, vários países, principalmente da Europa, criaram sistemas públicos. Os modelos têm financiamento público, não têm o lucro como objetivo final e perseguem temas de interesse público e que não têm apelo comercial. Buscam seguir esses princípios a Inglaterra, com a centenária BBC, o Japão, com a NHK, os Estados Unidos, com emissoras do sistema PBS e, na Alemanha, são conhecidos os sistemas ZDF, ARD e a Deustche Welle (DW), por exemplo.

No Brasil, a criação da EBC ocorre apenas em 2008, duas décadas depois de promulgada a Constituição. Na reabertura democrática, grupos progressistas ligados a movimentos sociais pressionaram por regras mais transparentes e equilibradas no campo da comunicação, diante do oligopólio midiático nacional concentrado nas mãos de seis empresas familiares e que detém cerca de 90% da audiência de leitores, ouvintes e telespectadores do país.

No entanto, depois do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, as salvaguardas que caracterizavam a EBC como uma estrutura pública, nos moldes das recomendações internacionais, sofreram ataques que as debilitaram. O desmonte do arcabouço legal teve início no governo de Michel Temer, com a cassação do Conselho Curador e o mandato de presidente da EBC, que garantiam certa autonomia. Logo depois, veio a fusão da TV Brasil como o canal do Poder Executivo, a NBR, dando origem a uma “deglutição do sistema público pelo estatal/governamental” que não foi revertido mesmo após questionamento do Ministério Público Federal (MPF).

Se sociedades com democracia consolidada ajudam a fortalecer os pilares da comunicação pública, o contrário também acontece com democracias frágeis. Porém, sem democracia não há condições para o desenvolvimento do país e as reduções das desigualdades, cada vez mais acentuadas.

 

Trabalhadores

Os casos de perseguição e adoecimento mental se multiplicam na empresa, reuniões de pautas não existem mais, as conversas sobre as coberturas também não. Impera a linha autoritária de comando e o desgaste das equipes, reduzidas por planos de demissão voluntária e falta de concurso.

O sufocamento dos trabalhadores ocorre também pela suspensão do Acordo Coletivo, que agora está na justiça, por falta de negociação por parte da empresa. A categoria segue há 5 anos sem recomposição salarial pelo índice de inflação, incluindo três anos sem recomposição nenhuma.

Algumas formas de resistência estão em curso. Além desse dossiê e da Ouvidoria Cidadã da EBC, foram feitas denúncias de uso indevido dos veículos públicos ao Tribunal Superior Eleitoral e à CPI da Pandemia. A Rádio MEC e a Nacional também foram declaradas Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado do Rio de Janeiro. Por iniciativas como essas, o conjunto dos trabalhadores da EBC será homenageado este ano pela 44ª edição do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos (PVH). Porém, é necessário mais.

Precisamos que as candidaturas em todos os níveis se comprometam com a comunicação pública e que os presidenciáveis incluam o tema em seus programas de governo e declarações públicas. A comunicação pública é um indicador da democracia e consta de marcos internacionais da Unesco e da OCDE, além de ser um importante instrumento de democratização da comunicação no país.

Não menos importante é a instalação de mecanismo similar à Comissão da Verdade para apurar e punir abusos e ilegalidades cometidos na empresa de comunicação pública nos últimos anos.

 

SERVIÇO
Lançamento do 4º Dossiê de Censura e Governismo da EBC
31 de agosto, quarta-feira, 20h
Participação: Beatriz Kushnir (Unirio), Iluska Coutinho (UFJF)
Mediação: Letycia Bond (EBC/USP)
Youtube do SJPDF: https://www.youtube.com/channel/UCidFmWPskAkZoob4mLxT3lA/featured

Contatos para entrevista:
Carol Barreto, jornalista da EBC, dirigente do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro – (21) 99955-7233
Juliana Cézar Nunes, jornalista da EBC, dirigente do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal – (61) 9249-7074

 

Confira aqui o documento completo:

Dossiê Censura e Governismo EBC 4ª Edição- FINAL

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