Criação do Departamento Oficial de Propaganda (DOP);
Decreto 20.047 regula as radiocomunicações da exclusiva competência da União.
Decreto 21.111 aprova o regulamento para a execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional.
DOP é substituído pelo Departamento de Propaganda e Difusão Cultural(DPDC).
DPDC é transformado em Departamento Nacional de Propaganda (DNP).
Decreto-lei 1.915 - DNP vira Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) com um DEIP em cada estado.
Decreto 5.007 aprova o regimento interno e o Decreto-lei 1.949 regulamenta o DIP.
Decreto-lei 2.073 incorpora Rádio Nacional ao patrimônio da União.
Decreto-lei 7.582 extingue o DIP e cria o Departamento Nacional de Informações (DNI).
Decreto-lei 8.356 acaba com a censura prévia na imprensa e na radiodifusão.
Lei 2.083 regula a liberdade de imprensa.
Decreto 42.943 outorga às Empresas Incorporadas ao Patrimônio na União a concessão para estabelecer uma estação de radiotelevisão.
Decreto 49.259 cria a Campanha Nacional de Radiodifusão Educativa para promover teleducação.
Lei 4.117 - Código Brasileiro de Comunicações.
Decreto-lei nº 236 modifica o CBT, cria televisão educativa de caráter não-comercial.
Decreto 65.239 - Estrutura para fazer o Sistema Avançado de Tecnologias Educacionais, incluindo rádio, televisão e outros meios.
Decreto 67.611 - Sistema de Comunicação Social do Poder Executivo, vincula Assessoria Especial de Relações Púbicas da Presidência da República.
Portaria 408 - Obrigatoriedade de conteúdo educativo nas TVs.
Lei 6.301 - Empresa Brasileira de Radiodifusão (Radiobrás), vinculado ao Ministério das Comunicações.
Decreto 77.698 constitui a Radiobrás.
Lei 6.650 cria a Secom, à qual é vinculada a Radiobrás.
Decreto 83.993 constitui a Empresa Brasileira de Notícias (EBN), vinculada à Secom.
SECOM é extinta e as funções incorporadas à chefia da Casa Civil. Radiobrás volta ao Ministério das Comunicações e a EBN ao Ministério da Justiça.
Decreto 96.212, de 22 de junho incorpora a EBN à Radiobrás, que passa a se chamar Empresa Brasileira de Comunicação.
Constituição Federal estabelece a complementariedade entre sistemas estatal, público e privado (artigo 223).
Decreto 95.955 autoriza a Radiobrás a alienar emissoras de rádio e televisão.
Decreto 99.244 muda a Radiobrás do Ministério das Comunicações para o da Justiça.
Lei 8.389 institui Conselho de Comunicação Social.
Secom recriada.
Lei do Cabo institui a obrigatoriedade um canal educativo-cultural.
Lei 9.612 institui serviço de radiodifusão comunitária.
Decreto 4.454 vincula a Radiobrás à Secom.
Decreto 5.371 institui as Retransmissoras Institucionais.
MP 398 cria a EBC, convertida na Lei 11.652/2008. Incorpora os serviços e bens da Radiobrás e da Acerp
Participação Social - Ouvidoria e Conselho Curador.
Lei 12.485, do acesso condicionado.
Manual de Jornalismo da EBC.
Seminário modelo Institucional da EBC: balanços e perspectivas.
MP 744, convertida na lei 13.417 de 2017, retira dispositivos de comunicação pública da EBC.
Campanha Fica EBC.
Plano de Demissão Voluntária
Dossiê da Censura
Portaria 216 da EBC unifica programação da TV Brasil com a NBR governamental.
Recriação do Ministério das Comunicações, ao qual é vinculada a EBC.
Qualificação da EBC para o PPI.
Lançamento da Ouvidoria Cidadã da EBC.
Entrada da EBC no Programa Nacional de Desestatização (PND).
Criado em 1931 como Departamento Oficial de Publicidade e substituído em 1934 pelo Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (DPDC), a intenção do governo com o órgão foi o de implantar uma política de controle da informação transmitida pelo rádio e pela imprensa. Entre as iniciativas está a criação do radiofônico Programa Nacional e da Agência Nacional, ambos para divulgar as iniciativas do governo.
Fonte: CPDOC/FGV
Com a implantação do Estado Novo, o DPDC vira Departamento Nacional de Propaganda (DNP) em 1938 , passando a exercer funções de “educação nacional”, controle da imprensa e censura, bem como a promoção do Brasil no exterior, com o lançamento de jornalistas e escritores nacionais em jornais estrangeiros e a criação do Boletim de Informações, editado em quatro idiomas e distribuído em hotéis, consulados, embaixadas e navios. Ainda em 1938, o DNP lança o programa A Hora do Brasil, em substituição ao Programa Nacional, com estreia em 3 de janeiro e transmissão em cadeia nacional.
Fonte: CPDOC/FGV
O Departamento de Imprensa e Propaganda foi criado pelo Decreto-lei 1.915, de 27 de dezembro de 1939, com o regimento interno aprovado pelo Decreto 5.077, de 29 de dezembro, e teve o exercício regulamentado pelo Decreto-lei 1.949, de 30 de dezembro. O texto determina a entrada em funcionamento no dia 1º de janeiro de 1940.
Em plena vigência do Estado Novo de Getúlio Vargas, o DIP, que sucedeu o DNP, foi criado com o objetivo de difundir a ideologia do governo e promover o chefe do governo e as realizações do poder executivo, sendo um porta-voz oficial do regime.
O texto legal coloca o DIP diretamente subordinado ao Presidente da República, com a função de “elucidação da opinião nacional sobre diretrizes doutrinárias do regime, em defesa da cultura, da unidade espiritual e da civilização brasileiras”, bem como “organizar e dirigir o programa de rádio-difusão oficial do Governo”.
O departamento tinha divisões de divulgação, radiodifusão, cinema e teatro, turismo e imprensa, além de filmoteca, biblioteca e discoteca. Entre as funções estava a organização de eventos e a censura prévia a publicações e espetáculos.
Aguiar e Lisboa destacam que “a configuração getulista para a comunicação estatal subordinou a uma mesma estrutura burocrática tanto a censura quanto a distribuição de informações”, já que o DIP era responsável pela Hora do Brasil e também pela Agência Nacional.
De acordo com Jambeiro et al (2004), o DIP foi responsável pela “transformação da estrutura da comunicação de massa no País”.
“A partir dele, até o final do século XX, a atividade regulatória, sempre centralizada no Poder Executivo federal, deixou de ter função exclusivamente técnica, assumindo um caráter político que incluiu, em vários momentos a censura e a perseguição aos jornalistas, proprietários de órgãos de imprensa e concessionários de radiodifusão”.
O autor destaca que o DIP foi utilizado para a autopromoção do governante e para disseminar a ideologia do Estado Novo, por meio de controle de jornais, revistas, rádios, editoras, espetáculos e festas, inclusive religiosas e o carnaval. Além disso, também teve papel importante na consolidação do rádio como veículo de comunicação de massa, fazendo a apuração dos concursos musicais promovidos pela Rádio Nacional.
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Fonte: CPDOC/FGV, Aguiar e Lisboa (2016) e Jambeiro et al (2004)
Em 1945, o DIP é sucedido pelo Departamento Nacional de Informações (DNI), subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, por meio do Decreto-Lei nº 7.582, do dia 25 de maio, assinado ainda por Getúlio Vargas, já perto de sua saída do governo, o que ocorreu no dia 29 de outubro.
O decreto vincula a Agência Nacional ao diretor-geral do DNI e mantém o órgão com a função de fazer a “distribuição de noticiário e serviço fotográfico, em caráter meramente informativo, à imprensa da Capital e dos Estados”. Entre as funções do DNI estava também “organizar e dirigir os programas de radiodifusão do Govêrno”. O decreto-lei determina, ainda que os Departamentos Estaduais de Imprensa e Propaganda (DEIPs) passam a chamar Departamentos Estaduais de Informações.
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Com o fim do Estado Novo, o Decreto-Lei 8.356, de 12 de dezembro de 1945, acaba com a censura prévia na imprensa e na radiodifusão.
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Fonte: Legislação
O DNI foi extinto em 1946 pelo decreto-Lei 9.788, assinado por Eurico Gaspar Dutra no dia 6 de setembro. O texto mantém a Agência Nacional, que passa a ser subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores e com uma função “meramente informativa das atividades nacionais em todos os setores competindo-lhe ministrar ao público, aos particulares, às associações e à imprensa tôda sorte de informações sôbre assuntos de interêsse da nação, ligados à sua vida econômica, industrial, agrícola, social, cultural e artística”. A agência também fica com a obrigação de “manter o jornal cinematográfico de caráter noticioso e o boletim informativo radiofônico de irradiação para todo o país”.
Segundo Aguiar e Lisboa (2016), no período a órgão passa a enfatizar a produção audiovisual, vindo a produzir um total de 958 cinejornais entre as décadas de 1940 e 1970, com filmetes curtos de atos oficiais e minidocumentários sobre temas de interesse do governo.
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O Decreto nº 42.943, de 30 de dezembro de 1957, outorga à Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União, que controlava a Rádio Nacional, a concessão para estabelecer uma “estação de radiotelevisão nesta capital”.
Na regulamentação do campo público de comunicação, a década de 1960 teve muitos marcos, principalmente dentro da discussão da TV como instrumento de educação. Esta agenda política foi incentivada como instrumento do Estado para responder à demanda de massificação da educação, frente às necessidades dos capitais nacionais e internacionais por mão-de-obra mais qualificada, ou minimamente instruída, dentro do processo de industrialização do país.
Já em 1960, o decreto nº 49.259, assinado pelo presidente Juscelino Kubitschek, institui a Campanha Nacional de Radiodifusão Educativa (CNRE), “a cargo do Serviço de Radiodifusão Educativa (S.R.E.) e diretamente subordinada ao Ministro de Estado da Educação e Cultura”, segundo o artigo 1º do texto legal. O objetivo era proporcionar as iniciativas da chamada “teleducação”, entre outras finalidades descritas no artigo 2º:
Para tanto, foi criada pelo decreto nº 49.913, de 12 de janeiro de 1961, a Orquestra Sinfônica Nacional, componente da CNRE, composta por 90 profissionais contratados após prova de seleção e submetidos a prova de suficiência a cada três anos. A norma oferece aos músicos da Rádio Nacional a oportunidade de migrar para o novo serviço, se aprovados na prova de seleção.
Links:
Fonte: Valente (2009) e Legislação.
Em 1961 o decreto 50.840 modifica o Regulamento para a execução dos serviços de radiocomunicação e em 1962 a lei nº 4.117 institui o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), regulamentado pelo decreto 52.795 de 1963. O artigo 3º do decreto estabelece que “os serviços de radiodifusão têm finalidade educativa e cultural, mesmo em seus aspectos informativo e recreativo, e são considerados de interêsse nacional, sendo permitida, apenas, a exploração comercial dos mesmos, na medida em que não prejudique êsse interêsse e aquela finalidade”.
Portanto, a finalidade educativa e cultural do rádio e da TV está fundamentada no texto legal brasileiro e deve ser seguida, inclusive, pelas emissoras comerciais. Havia também uma política de reserva de canais para a televisão educativa, feita pelo órgão regulador da época, o Conselho Nacional de Telecomunicações (Contel), criado com o CBT. Em 1965 o Contel reserva 55 canais para a televisão educativa, a pedido da Liga de Defesa Nacional.
Uma modificação importante no CBT para o campo público da comunicação foi feita em 1967 pelo decreto-lei nº 236 , instituindo a televisão educativa, de caráter não-comercial. Este ano é o marco do nascimento da TV pública no país, já que, com isso, foi possível criar a TVE e outras emissoras estaduais, além das universitárias. O texto do decreto dispensa as emissoras educativas e não comerciais de publicação de edital para conseguir a outorga, o que facilitou os governos estaduais, municipais, a União, universidades e fundações a conseguirem seus canais.
O decreto institui que “a televisão educativa se destinará à divulgação de programas educacionais, mediante a transmissão de aulas, conferências, palestras e debates”. Impõe também que “a televisão educativa não tem caráter comercial, sendo vedada a transmissão de qualquer propaganda, direta ou indiretamente, bem como o patrocínio dos programas transmitidos, mesmo que nenhuma propaganda seja feita através dos mesmos”.
A partir de 1967, o governo militar passou a usar a teleducação como instrumento ideológico de articulação do discurso dominante. De 1967 a 1975 foram criadas nove emissoras educativas, sendo seis vinculadas a secretarias estaduais de Educação ou de Cultura, como a TV Cultura de São Paulo, e três ao Ministério da Educação e Cultura, incluindo a TV Educativa do Rio de Janeiro, operada pela FCBTVE, e a primeira delas, vinculada à Universidade Federal de Pernambuco.
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Fontes: Valente (2009), Pieranti (2018), Azevedo et al (2009), CPDOC/FGV e Legislação
Em 1969 o decreto nº 65.239 cria a Estrutura Técnica e Administrativa para a elaboração do projeto de um Sistema Avançado de Tecnologias Educacionais, incluindo rádio, televisão e outros meios. Entre as justificativas para a criação da estrutura, que consta no texto legal, está que “o atual sistema educacional brasileiro não apresenta condições para, a curto prazo, suprir as exigências sempre crescentes do desenvolvimento econômico, social e cultural do País, e que o elevado índice de analfabetismo constitui limitação ao pessoal de aproveitamento da mão-de-obra e à democratização de oportunidades”.
Resultou deste esforço a aprovação dos objetivos para as atividade de televisão educativa no Brasil, expressa na articulação entre a instrução e recuperação do tempo perdido no ensino formal com a difusão de conteúdos de legitimação do modelo empregado no país.
O decreto nº 63.592 de 1968 cria um grupo de trabalho para “estudar e propor a sistematização jurídica das emissoras de radiodifusão de sons (radiodifusão sonora) e de sons e imagens (televisão) pertencentes ao Govêrno da União ou por êle incorporadas ou administradas”. O relatório conclusivo deveria indicar, obrigatoriamente “medidas referentes aos serviços de radiodifusão de sons e de sons e imagens (televisão) que possibilitem melhor aproveitamento dos mesmos”. Integraram o grupo de trabalho os veículos retratados na presente pesquisa, conforme detalha o artigo 2º:
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Fonte: Pieranti (2018) e Valente (2009)
Com a Portaria 408 de 1970 do Ministério da Educação e Cultura, que tornou obrigatório às emissoras de televisão a veiculação de cinco horas semanais de programas educativos, muitas emissoras comerciais passaram a utilizar o conteúdo produzido pela FCBTV/MEC.
As emissoras vinculadas ao governo federal iam além da programação que colocavam no ar. Os estúdios da Rádio MEC, por exemplo, eram usados para a gravação de discos, totalizando oito mil até 1955, além de atividades de assistência técnica e formação de profissionais para a TV educativa.
A FCBTVE produziu, no ano de 1971, 360 aulas, 46 adaptações de filmes, 43 entrevistas, 404 flashes de pedagogia social, um curso de pintura e 54 programas de temática diversa. O programa mais famoso produzido pela FCBTVE, premiado internacionalmente, foi o curso-série “João da Silva”, uma novela didática protagonizada pelo ator Nelson Xavier, produzida em 1973 e transmitida por canais comerciais como a TV Tupi e a TV Globo. O formato inovou ao fugir do padrão de aula filmada dos conteúdos educativos. Foram feitos 125 capítulos e a primeira prova final aplicada dentro do programa de teleducação foi feita por 15 mil alunos.
Fonte: Azevedo et al (2009), Pieranti (2018), Valente (2009) e CPDOC/FGV.
Em meados da década de 1970, haviam dezenas de emissoras educativas vinculadas à União, aos estados, municípios ou universidades, além de muitos planos para serem utilizadas na “teleducação”. Os planos de capacitação em massa por esse meio naufragariam em pouco tempo, mas as emissoras eram uma realidade, embora se encontrassem pulverizadas entre ministérios diversos e sem coordenação.
Em 1971, essas emissoras foram objeto de análise pelo Ministério das Comunicações, que defendeu a criação de uma entidade capaz de coordenar os serviços de rádio e de televisão explorados diretamente pela União. Esse momento chegou com a lei nº 6.301, de 15 de dezembro de 1975, que cria a Empresa Brasileira de Radiodifusão (Radiobrás), vinculada ao Ministério das Comunicações. Os objetivos descritos no art. 1º do texto legal são:
Apesar da explícita vinculação ao governo, as emissoras da Radiobrás foram incumbidas pela lei de “operar dentro de elevados padrões técnicos e propiciar a cobertura necessária para atender sobretudo às regiões de baixa densidade demográfica e reduzido interesse comercial, e às localidades julgadas estrategicamente importantes para a integração nacional”. Um claro objetivo de comunicação pública, com um toque de governamental na “integração nacional”.
A Radiobrás foi constituída pelo decreto nº 77.698, de 27 de maio de 1976, incorporando ao patrimônio da nova empresa os bens e imóveis da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, Fundação Rádio Mauá e TV Rádio Nacional de Brasília. A Rádio Mauá do Rio de Janeiro pertencia à época ao Ministério do Trabalho, sendo extinta na ocasião e a frequência devolvida à Rádio Ipanema, inaugurada em 1944. O decreto também determina que “serão consideradas extintas as estações de radiodifusão pertencentes a órgão da Administração Federal indireta ou às entidades sob supervisão ministerial”.
A criação da Radiobrás sinaliza a intenção do governo de ampliar o projeto de radiodifusão para além dos conteúdos educativos, incluindo a produção de informações e o atendimento a regiões sem cobertura comercial.
A mesma Lei estabelece como foco da irradiação dos meios da empresa regiões de baixa densidade demográfica e reduzido interesse comercial, e em localidades consideradas estrategicamente importantes para a integração nacional, reproduzindo agora em nova instituição o perfil de “complementaridade marginal” do modelo de radiodifusão pública no país.
O sonho de cobrir a Amazônia com as ondas de rádio substituiu o projeto de direcionar as emissoras em ondas curtas ao exterior, o que já era feito por emissoras públicas estrangeiras e pela Rádio Nacional. Porém, o grande projeto de integração nacional não vingou com a estrutura disponível. A Radiobrás oferecia uma rara oportunidade de organizar as estações vinculadas à União, planejar e potencializar sua atuação.
Porém, a expectativa durou pouco, a reboque do fracasso das políticas de “teleducação” e da dificuldade enfrentada na economia brasileira, que caminhava para a era da hiperinflação. Portanto, na prática a Radiobrás recebeu emissoras pequenas, deficitárias e sem grandes projetos de programação, apesar de ter entre elas a imponente mas fragilizada Rádio Nacional.
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Fonte: Pieranti (2018), Valente (2009), CPDOC/FGV e Legislação
Ainda em 1980, o decreto nº 85.550, de 18 de dezembro, extingue a Secom e incorpora suas funções à chefia da Casa Civil. A Radiobrás volta ao Ministério das Comunicações e a EBN fica vinculada ao Gabinete Civil da Presidência da República. Menos de um mês depois, no dia 7 de janeiro de 1981, o decreto nº 85.631 coloca a EBN sob vinculação do Ministério da Justiça. Dois meses depois, o decreto nº 85.795 institui a Secretaria de Imprensa e Divulgação (SID) no Gabinete Civil da Presidência da República, que fica responsável por orientar as atividades de comunicação social da EBN e da Radiobrás, sem prejuízo da vinculação delas aos ministérios da Justiça e das Comunicações.
O presidente José Sarney muda novamente a estrutura burocrática da comunicação do governo com o decreto nº 92.400, de 1986, que aprova o Regimento do Gabinete Civil e cria a Subchefia para Assuntos de Comunicação Social dentro do Gabinete. Entre as funções dessa Subchefia está “orientar as atividades de comunicação social da Empresa Brasileira de Notícias - EBN e da Empresa Brasileira de Radiodifusão – RADIOBRÁS”, sem prejuízo à vinculação delas aos ministérios citados acima. O regimento é consolidado pelo decreto nº 92.614.
No começo do ano seguinte, o decreto nº 93.953, de 21 de janeiro de 1987, altera a Secretaria de Imprensa e Divulgação, que passa a chamar Secretaria de Imprensa da Presidência da República, mantendo a sigla SID, e a integrar o Gabinete Pessoal do Presidente da República. Entre as funções da nova SID estão “promover a divulgação dos atos e atividades do Presidente da República” e “preparar programas de rádio e televisão e coligir matérias, notícias, informe e artigos, de interesse do Presidente da República”. No mesmo dia, o decreto nº 93.954 institui a Secretaria Especial de Comunicação Social da Administração Federal – Secaf, também dentro da estrutura do Gabinete Pessoal, a quem se reportam a EBN e a Radiobrás, sem alterar a vinculação das empresas.
No ano seguinte, o decreto nº 95.676 de 27 de janeiro de 1988 institui o sistema de comunicação social e divulgação da Administração Federal (Sicom), reestruturando novamente toda a comunicação governamental. O órgão central do Sicom fica sendo a Subchefia para Assuntos de Imprensa e Divulgação (que passa a ser conhecida pela sigla SID), dentro do Gabinete Civil. É criado pelo decreto o Conselho Consultivo de Comunicação Social da Presidência da República, presidido pelo ministro-chefe do Gabinete Civil, com a finalidade de “opinar sobre questões relativas à comunicação social”. Compõem o Conselho também o Subchefe para Assuntos de Imprensa e Divulgação, os presidentes da EBN, da Radiobrás e da FCBTVE.
Esta é a primeira menção a um conselho consultivo de comunicação na legislação, embora com componentes totalmente vinculados ao governo. Cabe ressaltar que naquele momento o país passava pelas discussões em torno da nova Constituição e que a única comissão que não conseguiu entregar um relatório final foi justamente a da Família, da Educação, Cultura e Esportes, da Ciência e Tecnologia e da Comunicação. Segundo Venício Artur de Lima, em seu levantamento Conselhos de Comunicação Social, toda a disputa ocorreu em torno da criação do Conselho Nacional de Comunicação, em cuja proposta original teria como competências o poder para outorgar e renovar as concessões de radiodifusão, promover licitações de frequência, promover a introdução de novas tecnologias e dispor sobre a organização do sistema, além de fiscalizar as políticas de comunicação com base nos princípios da promoção da cultura nacional em suas manifestações regionais e garantir a pluralidade e descentralização dos serviços. Porém, o que foi para o texto da Constituição foi um órgão auxiliar do Congresso Nacional.
São extintas também pelo decreto nº 95.676 a antiga SID, a Secaf e a Comissão Consultiva, criada em 1981 pelo decreto nº 86.190 para “propor a formulação geral e específica da Política de Comunicação Social do Poder Executivo, estabelecendo diretrizes de planejamento, execução e controle”. Integram também o sistema a Radiobrás, que passa a se chamar Empresa Brasileira de Comunicação e a vincular-se ao Ministério da Justiça, e a Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa, que passa a vincular-se ao Ministério da Educação.
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Fonte: Lima (2008) e Legislação
Na década de 1980, o grande marco legal é a Constituição Federal de 1988. Promulgada no dia 5 de outubro, o artigo 223 prevê a complementaridade dos sistemas públicos, estatal e privado. Segundo Pieranti, essa é a primeira referência ao termo comunicação pública em texto legal no país. Em sua comparação entre o surgimento do sistema público no Brasil e no centro-leste europeu, ele destaca que o conceito surge em ambos contextos no mesmo momento, quando o Brasil deixava para trás as marcas da ditadura e os europeus analisados rompiam com o socialismo.
Em ambos os casos também, o autor lembra que o processo ocorreu na “emergência da democracia, que sucede regimes autoritários, e normalmente antes das primeiras eleições em que a população poderia votar”. As bases do sistema estatal serviram de ponto de partida para o novo sistema.
Ele lembra que “não existiam emissoras de radiodifusão pública, cultura relacionada com este tema ou demandas estruturadas provenientes de grande parte da sociedade civil”, nem no Brasil nem no centro-leste europeu, bem como “estruturas regulatórias aptas a defender a autonomia das emissoras públicas em relação ao poder público”. Com isso, a estrutura da comunicação pública com estreita relação com o poder instituído fica sujeita a mudanças nas regras de operação e nos dirigentes das emissoras.
O professor e pesquisador Venício Lima destaca que a televisão pública é fundamental nas circunstâncias brasileiras, por oferecer, potencialmente, uma alternativa ao sistema privado. De acordo com ele, a inserção do termo na Constituição de 1988 ocorreu por causa do grande desequilíbrio que há no setor de comunicação brasileiro, com peso desproporcional para o sistema privado, situação que se perpetua até os dias atuais.
Lima destaca que, em países como a Inglaterra, onde o sistema de comunicação começou público, a busca por alternativa ao sistema privado não é necessária, pois este era limitado pela busca do lucro.
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Fonte: Pieranti (2018), Ramos et al (2017) e Legislação
A decadência do sistema de comunicação do governo continua com o decreto nº 95.955 de 1988, que autoriza a Radiobrás a alienar 14 emissoras de rádio, sendo 12 em FM e duas em OM, e uma de televisão em Porto Velho, fazendo o total de emissoras federais de rádio cair de 46 em 1982 para 29 em 1988 e de TV de sete para cinco no mesmo período. Segundo Pieranti, os ativos da empresa “foram simplesmente entregues, sem observar os ritos necessários, parindo pendências burocráticas”, passando para a iniciativa privada, governos estaduais e municipais.
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Fonte: Pieranti (2018) e Legislação
Na comunicação de governo, o decreto nº 99.181 de 1990 cria a Coordenação de Comunicação Social dentro da Secretaria-geral da Presidência da República. No mesmo ano, o decreto nº 99.244 reorganiza os órgãos da Presidência da República e os Ministérios, mudando a vinculação da Radiobrás do Ministério das Comunicações para o da Justiça.
E em 25 de julho o decreto nº 99.411 cria a Secretaria de Imprensa dentro da estrutura da Secretaria-geral da Presidência da República, com funções, entre outras, de “coordenar a política de comunicação social da Administração Pública Federal”; “convocar redes obrigatórias de rádio e televisão para a transmissão de pronunciamentos do Presidente da República e de Ministros de Estado e decidir sobre questões concernentes a programas e redes, obrigatórios ou facultativos, de responsabilidade do Poder Executivo”; “preparar textos cuja divulgação pela imprensa e programas de rádio e televisão seja de interesse da Presidência da República”; e “orientar a linha editorial de veículos de comunicação (agências de notícias e emissoras de rádio e televisão) mantidos pelo Governo Federal”.
Não está explícito aqui se a Radiobrás e a Agência Brasil estão incluídas nessas orientações, já que neste período ambas eram vinculadas ao Ministério da Justiça. Tal vinculação deixa de aparecer na lei nº 8.490, de 1992, que reorganiza o executivo federal, e no decreto nº 761, de 1993, que reestrutura o Ministério da Justiça. A Radiobrás, porém, não aparece em tais regramentos.
Um novo Estatuto da Radiobrás é instituído pelo decreto nº 2.958, de 8 de fevereiro de 1999, que a denomina como “empresa pública com personalidade jurídica de direito privado, organizada sob a forma de sociedade por ações, vinculada à Secretaria de Estado de Comunicação do Governo” (artigo 1º). No artigo 5º do Estatuto, o objeto social da empresa descreve funções estritamente governamentais, como “divulgar as realizações do Governo Federal nas áreas econômica, política e social”, “implantar e operar emissoras e explorar serviços de radiodifusão do Governo Federal” e “recolher, elaborar, produzir, transmitir e distribuir, diretamente ou em colaboração com os meios de comunicação social, o noticiário, fotografias, boletins e programas, referentes a atos e fatos da Administração Pública Federal”.
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Fonte: Legislação.
O Conselho de Comunicação Social, previsto no artigo 224 da Constituição Federal, foi instituído pela Lei nº 8.389, de 30 de dezembro de 1991, como órgão auxiliar do Congresso Nacional e composto por representantes da sociedade civil, das empresas de comunicação e categorias profissionais. A atribuição é realizar “estudos, pareceres, recomendações e outras solicitações que lhe forem encaminhadas pelo Congresso Nacional” sobre o tema, conforme descrito no caput do artigo 2º da lei. Após a criação da EBC, o órgão também passou a revisar as atas e deliberações do Conselho Curador da empresa pública.
Em seu levantamento sobre os Conselhos de Comunicação Social no Brasil, Venício Lima (2013) defende que “a participação popular na formulação e acompanhamento de políticas públicas implementadas pelo Estado constitui um fator decisivo para o fortalecimento da democracia. Os vários tipos de conselhos, em seus diferentes níveis – nacional, estadual e municipal – constituem poderosos instrumentos desta participação”. Sendo os conselhos uma das características da “Constituição Cidadã” de 1988. Porém, Lima ressalta que o Conselho de Comunicação Social (CCS) só foi instalado em 2002, enfrentando diversos obstáculos.
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Fonte: Lima (2013) e Legislação
Em primeiro de janeiro de 1995, a Medida Provisória 813 reorganiza os órgãos da Presidência da República, recriando a Secretaria de Comunicação Social com as atribuições de “assistir direta e imediatamente o Presidente da República no desempenho de suas atribuições, especialmente nos assuntos relativos à política de comunicação social do governo, e de implantação de programas informativos e de educação à distância, cabendo-lhe o controle, a supervisão e coordenação da publicidade dos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta e de sociedades sob controle da União”.
O texto não fala da Radiobrás e foi reeditado 44 vezes ao longo dos três anos subsequentes, até a Medida Provisória nº 1.651-43, de 5 de maio de 1998, finalmente ser convertida na Lei nº 9.649 , de 27 de maio de 1998. Por sua vez, a Lei nº 9.649 foi alterada pela Medida Provisória nº 1.795, de primeiro de janeiro de 1999, que transforma a Secretaria de Comunicação Social em Secretaria de Estado de Comunicação de Governo, “órgão de assessoramento direto ao Presidente da República”, e cria o cargo de Secretário de Estado de Comunicação de Governo. A MP é reeditada 36 vezes, incluindo a modificação que dá status de Ministro ao Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo da Presidência da República, até a MP nº 2.216-37, de 31 de agosto de 2001. No texto legal, a Secom passa a ter a competência de “assistir direta e imediatamente ao Presidente da República no desempenho de suas atribuições, especialmente nos assuntos relativos à política de comunicação e divulgação social do Governo e de implantação de programas informativos, cabendo-lhe a coordenação, supervisão e controle da publicidade dos órgãos e das entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta, e de sociedades sob controle da União, e convocar redes obrigatórias de rádio e televisão”. Destaca-se que entre os objetivos da Secom não consta mais a promoção da educação à distância.
O Decreto nº 2.004 , de 11 de setembro de 1996, muda o nome do Sicom de Sistema Integrado de Comunicação Social da Administração Pública Federal para Sistema de Comunicação Social do Poder Executivo Federal, tendo como órgão central a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) e como órgãos setoriais as unidades administrativas dos Ministérios e dos órgãos da Presidência da República que tenham a atribuição de gerir atividades de comunicação social. Nos objetivos do sistema constam:
Ou seja, atribuições de comunicação pública e de comunicação governamental. O decreto dá à Radiobrás a atribuição de distribuir a publicidade legal. Em 1999, o decreto 3.296, de 16 de dezembro, muda o nome do Sicom novamente, desta vez para Sistema de Comunicação de Governo do Poder Executivo Federal.
Links:
Fonte: Legislação
Ainda na década de 1990, uma nova lei impulsiona as emissoras do campo público no Brasil, incluindo as TVs legislativas, universitárias e judiciárias. A lei nº 8.977, de 6 de janeiro de 1995, conhecida como Lei do Cabo, institui os “Canais básicos de utilização gratuita”, ou seja, canais que deveriam entrar nos pacotes básicos dos serviços de TV da TV paga.
O texto garante espaço para um canal legislativo compartilhado entre a câmara de vereadores do município e a assembleia legislativa do estado, um para a Câmara dos Deputados e um para o Senado Federal. No caso dos canais legislativos, a lei especifica a função de “documentação dos trabalhos” e de “transmissão ao vivo das sessões”.
A reserva deve ser feita, ainda, para um canal universitário, um comunitário e um canal educativo-cultural, que será “reservado para utilização pelos órgãos que tratam de educação e cultura no governo federal e nos governos estadual e municipal com jurisdição sobre a área de prestação do serviço”. A lei nº 10.461 , de 17 de maio de 2002, incluiu um canal para o Supremo Tribunal Federal, “para a divulgação dos atos do Poder Judiciário e dos serviços essenciais à Justiça”.
Valente (2009) destaca que a iniciativa foi importante para impulsionar os canais legislativos, porém não se consolidou a criação do canal ligado aos ministérios da Educação e da Cultura. Com isso, a “vaga” foi ocupada pelo canal governamental NBR, criado em 1998 e operado pela Radiobrás.
Links:
Fonte: Valente e legislação
Sem relação direta com a EBC, mas extremamente relevante dentro do tema da democratização da mídia no país, área em que a comunicação pública está inserida, em 1998 foi publicada a lei nº 9.612, que “institui o Serviço de Radiodifusão Comunitária”. O artigo 3º define como finalidades da radiodifusão comunitária:
O artigo 4º define os princípios que devem ser seguidos pela programação:
O parágrafo 1º do artigo 4º destaca a proibição de proselitismo de qualquer natureza na programação. Na lei que criou a EBC, muitos desses princípios se repetem no texto que norteia a comunicação pública, obviamente que num nível nacional e não comunitário.
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Fonte: Legislação
O decreto nº 4.046, de 2001, extingue o cargo de Ministro da Secom e transforma a Secretaria de Comunicação de Governo da Presidência da República em Secretaria de Estado de Comunicação de Governo. As mudanças na estrutura continuam com a Medida Provisória 13, de 11 de dezembro de 2001, que cria o cargo de Secretário de Estado de Comunicação de Governo, convertida na lei nº 10.415, de 21 de março de 2002. Em 31 de outubro 2002 o Decreto nº 4.454 aprova a estrutura e o quadro de cargos da Secom, vinculando a Radiobrás à estrutura do Planalto.
Com o novo governo, a partir de 2003, a estrutura de comunicação oficial sofre novas reestruturações. A Medida Provisória nº 103, de primeiro de janeiro de 2003, reorganiza a estrutura da Presidência da República e dos Ministérios, transformando a Secretaria de Estado de Comunicação de Governo em Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República. A Secretaria de Imprensa e Divulgação do Gabinete da Presidência da República passa a ser Secretaria de Imprensa e Divulgação da Presidência da República e cria o cargo de Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica. O texto foi convertido na Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003.
Com o decreto nº 4.779, de 15 de julho de 2003, a Secom passa a ter o nome de Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República. Entre as atribuições está a “convocação de redes obrigatórias de rádio e televisão”. A Radiobrás permanece como entidade vinculada. Já o decreto nº 4.799, de 4 de agosto de 2003, institui que a comunicação de governo do Poder Executivo Federal terá como objetivos principais:
Parágrafo único. É vedada a publicidade que, direta ou indiretamente, caracterize promoção pessoal de autoridade ou de servidor público (DECRETO Nº 4.799, artigo 1º).
Vemos aqui alguns princípios de comunicação pública, como nas alíneas I e II, ao mesmo tempo que as funções governamentais estão explícitas nas alíneas III e IV. A única menção à Radiobrás no texto aparece no artigo 9º, que trata da distribuição da publicidade legal, incumbência dada à empresa.
O cargo de Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República é extinto pela Medida Provisória 259, de 21 de julho de 2005, convertida na lei nº 11.204, de 5 de dezembro do mesmo ano. Em 2006, o decreto nº 5.849, de 18 de julho, coloca a Secretaria de Comunicação Institucional abaixo da Secretaria Geral da Presidência da República, após a extinção da Secretaria de Comunicação anterior. Com isso, a Radiobrás passa a ser vinculada a essa Secretaria Geral.
Por sua vez, a Medida Provisória nº 360, de 28 de março de 2007, convertida na lei nº11.497, de 28 de junho de 2007, recria a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, com status de ministério. Embora o texto não trate da Radiobrás, o artigo 2º-B traz em sua alínea VII a atribuição de assistir o Presidente da República na “coordenação e consolidação da implantação do sistema brasileiro de televisão pública”.
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Fonte: Legislação
Valente destaca como impulso para o campo público da televisão a publicação do Decreto nº 5.371, de 2005, que institui a figura das retransmissoras institucionais, restritas à veiculação de conteúdos dos poderes da república, com até 15% de programação local. A norma determina a existência de um conselho para participação social, nos moldes internacionais da comunicação pública.
Segundo ele, o mecanismo foi um movimento para “tornar o serviço atraente às prefeituras”, que poderiam se interessar em veicular conteúdos próprios e distribuir produção feita pela TV Nacional, NBR, TV Câmara, TV Senado e TV Justiça. “A norma trazia inovações, como a obrigatoriedade de consultas públicas para a solicitação de uma estação e a distribuição do conteúdo inserido localmente em tempo igual entre a prefeitura, a câmara de vereadores e entidades da comunidade, além da exigência da criação de um conselho com participação de organizações da sociedade civil da área de abrangência do sinal para acompanhar e avaliar a prestação do serviço”.
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Fonte: Valente (2009)
Em 10 de outubro de 2007, a Medida Provisória 398 “institui os princípios e objetivos dos serviços de radiodifusão pública explorados pelo Poder Executivo ou outorgados a entidades de sua administração indireta, autoriza o Poder Executivo a constituir a Empresa Brasil de Comunicação - EBC”. A efetivação da criação da EBC e a aprovação de seu estatuto vieram pelo decreto nº 6.246, de 27 de outubro de 2007, depois alterados pelo decreto nº 6.689, de 11 de dezembro de 2008.
Lima aponta que um dos avanços no ano de 2007 foi a edição da MP 398, apesar dos intensos debates no Congresso Nacional e das 133 emendas recebidas. Por outro lado, ele critica o fato dos movimentos que levaram à construção da TV pública terem ficado de fora do processo de implementação da TV Brasil.
A primeira diretora-presidente da EBC, a jornalista Tereza Cruvinel, lembra que o projeto de criar a empresa pública de comunicação enfrentou “muita incompreensão e resistência”, além de não ter tido força política o suficiente para chegar a todo o país, tendo apenas três canais de televisão, em Brasília, no Rio de Janeiro e em São Luís.
O texto da MP foi convertido na Lei nº 11.652, de 7 de abril de 2008 e cria a EBC incorporando os bens, serviços e funcionários da Radiobrás e da Acerp. Segundo Valente, pode-se dizer que “a visão por trás do modelo da EBC aproxima-se daquela que compreende a de mídia pública como um espaço democrático necessário entre o mercado e o Estado”. No texto da lei, em seu artigo 2º, a prestação dos serviços de radiodifusão pública por órgãos do Poder Executivo seguirá os princípios da:
O artigo 3º define como objetivos:
Parágrafo único. É vedada qualquer forma de proselitismo na programação (LEI 11.652, art. 3º).
As competências da EBC são definidas no artigo 8º:
No corpo funcional, o quadro da EBC foi ampliado de cerca de 800 funcionários da Radiobrás para 2.500, majoritariamente aprovados em concurso público a partir de 2011.
Links:
Fonte: Lima (2012), Valente (2009), Unesco (2012), Stevanim (2017), Paulino e Silva (2013) e Legislação
A autonomia da EBC em relação ao governo federal seria garantida pelo mandato de quatro anos do diretor-presidente, mesmo que indicado pelo presidente da República, mas não coincidente com o do mandatário do país; pela Ouvidoria; e pelo Conselho Curador, formado por 22 membros, sendo quatro ministros de estado, 15 representantes da sociedade civil, um do Senado Federal, um da Câmara dos Deputados e um representante eleito pelos funcionários da EBC.
As funções do Conselho eram o de “zelar pelos princípios e pela autonomia da EBC, impedindo que houvesse ingerência indevida do Governo e do mercado sobre a programação e gestão da comunicação pública” ; e “representar os anseios da sociedade, em sua diversidade, na aprovação das diretrizes de conteúdo e do plano de trabalho da empresa”.
Tais funções seguem o modelo da britânica BBC, na qual o Conselho “é responsável por garantir o cumprimento da missão e propósitos públicos”, divulgando inclusive um Plano Anual e um Relatório Anual de prestação de contas.
No caso do Conselho Curador da EBC, não havia a previsão do colegiado ser responsável pelas atividades comerciais da empresa, mas os conselheiros tinham a função de aprovar o Plano Anual de Trabalho e as resoluções eram de cumprimento obrigatório.
O colegiado foi um marco fundamental para que a EBC fosse de fato pública. Para garantir que suas decisões fossem tomadas em nome do interesse público, a maior parte de seus membros representava a sociedade civil e eram escolhidos por meio de consulta pública, após a primeira composição de pessoas notáveis indicadas pelo presidente Lula. Era também a única instância com poder de destituir o diretor-presidente da EBC, caso fossem dados dois votos de desconfiança.
A primeira presidenta da EBC, Tereza Cruvinel (in PAULINO e SILVA, 2013, p. 29) destaca que a implantação dos mecanismos de autonomia foi uma prioridade da gestão, colocada em prática antes mesmo da conversão da medida provisória em lei.
“Tínhamos, nesse caso, que aprofundar o caráter público da gestão. O Conselho Curador foi empossado em 14 de dezembro de 2007, duas semanas depois da estreia da TV Pública. Os conselheiros foram nomeados pelo Presidente da República, ainda antes da aprovação da Lei, com base na Medida Provisória 398. Depois, no Congresso, houve a alteração que introduziu a escolha com base em consultas públicas à sociedade”.
Eliane Gonçalves (2016, p. 79) destaca que houve muita crítica e disputa no Congresso Nacional para a aprovação da forma e função do Conselho Curador. O principal problema apontado por ela foi justamente a falta de participação da sociedade civil na escolha dos nomes que iriam compor o colegiado. A solução legislativa para a participação de fato da sociedade no colegiado foi acrescentar no texto que apenas a primeira composição seria indicada pelo presidente da república, os membros seguintes seriam escolhidos por consulta pública. Na tramitação no Congresso Nacional também foram incluídos um representante da Câmara dos Deputados e um do Senado Federal.
A lei determina que os 15 representantes da sociedade civil seriam indicados “segundo critérios de diversidade cultural e pluralidade de experiências profissionais, sendo que cada uma das regiões do Brasil deverá ser representada por pelo menos 1 (um) conselheiro”. A primeira composição do Conselho Curador da EBC, chamado de “Conselho de Notáveis”, segundo decreto de 30 de novembro de 2007, foi:
O decreto de nomeação foi publicado no dia 3 de dezembro, um dia após a estreia da TV Brasil, mas o primeiro representante dos funcionários demorou mais de um ano após o início do funcionamento do colegiado para ser nomeado, em 9 de março de 2009, tendo sido eleito pelos pares o jornalista Lourival Macedo.
Sobre a implantação da Ouvidoria, Cruvinel explica que demorou um pouco mais por exigir mais estrutura dentro da empresa.
“A Ouvidoria dependia de alguns procedimentos internos e, principalmente, de que a empresa estivesse mais consolidada. O Conselho se reuniria uma vez por mês. Já a Ouvidoria funcionaria permanentemente, o que exigiria funcionários, estrutura logística, recursos materiais etc. Por isso, sua implantação atrasou-se um pouco, vindo a ser implantada em junho de 2008, logo depois da aprovação da Lei de criação pelo Congresso e da incorporação da Radiobrás pela EBC”.
A norma interna que regulamentou a Ouvidoria da EBC foi a número 001 e o primeiro ouvidor foi o professor Laurindo Leal Filho. Na transição entre a Radiobrás e a EBC, a ouvidoria da antiga estatal, exercida por Paulo Machado “supriu a deficiência inicial”, segundo Cruvinel. No texto da Lei 11.652, a Ouvidoria foi encarregada de “exercer a crítica interna da programação por ela produzida ou veiculada, com respeito à observância dos princípios e objetivos dos serviços de radiodifusão pública, bem como examinar e opinar sobre as queixas e reclamações de telespectadores e rádio-ouvintes referentes à programação”.
Leal Filho, em entrevista a Paulino e Silva (2013, p, 43), destaca que o trabalho inicial foi difícil, principalmente com o público interno da EBC.
“Não é uma prática comum no país e isso dificulta o entendimento. Até então só existiam duas ouvidorias de mídia no Brasil, na mídia impressa, nos jornais O Povo, do Ceará, e na Folha de S. Paulo. Essa falta de cultura de ouvidoria de mídia no Brasil levou a uma certa resistência inicial dentro da empresa. Não havia o hábito desse tipo de acompanhamento do trabalho profissional”.
A partir de 2018, o trabalho da Ouvidoria da EBC de crítica interna dos conteúdos foi desmontado, após o fim do mandato de Joseti Marques em março, cujo nome tinha sido escolhido seguindo perfil recomendado pelo Conselho Curador, em memorando de 2014.
Em novembro de 2018, após a publicação do Decreto nº 9.492/2018, que regulamentou a Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017, marcos que criam o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo Federal (e-OUV), a Ouvidoria da EBC passou a integrar a iniciativa governamental, que incluiu, segundo texto legal, “órgãos da administração pública federal direta, autárquica e fundacional”; “empresas estatais que recebam recursos do Tesouro Nacional para o custeio total ou parcial de despesas de pessoal ou para o custeio em geral”; e “empresas estatais que prestem serviços públicos, ainda que não recebam recursos do Tesouro Nacional para custeio total ou parcial de despesas de pessoal ou para o custeio em geral”.
Com isso, a Ouvidoria da EBC alinhou os procedimentos e foi incluída no atendimento on-line padronizado do governo federal, por meio da plataforma Fala.BR, da Controladoria-Geral da União. Nos sites dos veículos da EBC, foram incorporados botões com ícones coloridos para a manifestação do público sobre a qualidade dos conteúdos publicados, com as opções de denúncia, reclamação, elogio, sugestão, solicitação e simplifique.
Sobre o financiamento da comunicação pública e da EBC, como forma de garantir alguma autonomia financeira foi criada pela lei a Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública (CFRP), “com o objetivo de propiciar meios para a melhoria dos serviços de radiodifusão pública e para a ampliação de sua penetração mediante a utilização de serviços de telecomunicações” (LEI 11.652, 2008, art. 32). Os recursos viriam do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), cobrado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) das empresas do setor. Porém, disputas judiciais impediram desde o princípio que a EBC dispusesse desse recurso. Mesmo quando algumas empresas desistiram da briga na justiça, os recursos continuaram contingenciados pelo governo federal, nunca chegando de fato à EBC. Segundo a própria empresa, em 2016, a soma que poderia ser disponibilizada chegava a R$2 bilhões.
Por outro lado, a autonomia da empresa sempre foi prejudicada pelo fato de ter seu financiamento majoritário da União, a vinculação direta à Secretaria de Comunicação da presidência da República e o Conselho de Administração (Consad) composto por maioria de membros do governo. Bucci, Chiaretti e Fiorini (2012) alertam, na publicação sobre indicadores de qualidade para emissoras públicas, que o financiamento é um fator importante a ser considerado. Para os autores, o ideal é que os aportes financeiros previstos sejam protegidos por lei, o que não ocorre com a EBC.
“Não podem ser desviados, pela autoridade pública, para outras finalidades, e também não podem ser contingenciados de acordo com a discricionariedade do agente público. A lei, também, deve deixar expressa a não vinculação da emissora pública a qualquer autoridade externa ao seu próprio corpo funcional. Ressalte-se que os conselhos curadores, que abrigam representantes da sociedade e representantes de instituições, como universidades, são órgãos internos, que integram o corpo da emissora pública. O que contraria sua natureza de emissora pública não é a existência dos conselhos, nem a existência de representantes da sociedade nos conselhos, mas a subordinação, legal ou informal, tácita, a uma autoridade do Poder Executivo, do governo ou de outro poder estatal. A emissora pública não deve prestar qualquer forma de contrapartida política ao recebimento de recursos dos poderes públicos”.
Stevanim (2017) destaca que a configuração dada à EBC não atendeu às expectativas e reivindicações do movimento pela democratização da comunicação, já que aproximou a radiodifusão pública do Estado.
“À instituição caberia uma parcela das funções que antes competiam à Radiobrás, (...) encargo este que deixava sob sua alçada não somente incumbências ligadas à radiodifusão pública, mas também de comunicação estatal. Em relação à gestão, reforçava-se o caráter estatal, pois a administração ficou por conta de dois órgãos ligados ao Executivo Federal: o Conselho de Administração seria incumbido das questões de finanças e dos planos estratégicos e a Diretoria Executiva coordenaria as ações gerenciais da instituição. (...) A vinculação da estrutura da EBC com o Estado tornava a independência relativa, suscetível aos arranjos temporais de poder: tratava-se de uma empresa pública, com o quadro gestor nomeado pelo Presidente da República e uma parcela considerável dos recursos financeiros atrelada à aprovação governamental”.
Assim, mesmo sem atender completamente o que desejava a sociedade civil para uma empresa de comunicação pública, a EBC foi criada no intuito de suprir essa lacuna constitucional. Nos primeiros 8 anos de implementação do projeto, houve ações importantes na tentativa de consolidar uma comunicação pública como nos moldes discutidos até aqui, apesar de a empresa nunca ter alcançado a autonomia de fato.
Links:
Decreto da nomeação do primeiro Conselho Curador
Fonte: Unesco (2012), Stevanim (2017), Paulino e Silva (2013), Gonçalves (2016), BBC, Conselho Curador e Legislação
Em 2011, a Lei nº 12.485, do acesso condicionado, reserva um canal obrigatório em todos os pacotes ofertados pelas TVs pagas para a prestação de serviços de radiodifusão pública pelo Poder Executivo, atualizando a chamada Lei do Cabo, de 1990, que reservava um canal educativo-cultural para o governo federal. A previsão está no artigo 32, inciso V:
“um canal reservado para a prestação de serviços de radiodifusão pública pelo Poder Executivo, a ser utilizado como instrumento de universalização dos direitos à informação, à comunicação, à educação e à cultura, bem como dos outros direitos humanos e sociais”.
A lei mantém a reserva de um canal para a emissora oficial do Poder Executivo e outro de caráter educativo e cultural organizado pelo Governo Federal e “destinado para o desenvolvimento e aprimoramento, entre outros, do ensino a distância de alunos e capacitação de professores, assim como para a transmissão de produções culturais e programas regionais”
Dessa forma, a TV Brasil e a NBR têm espaço garantido nos pacotes básicos das TVs pagas.
Links:
Fonte: EBC, legislação, Cruvinel in Ramos et al (2017) e Unesco (2012)
Em 2011, a EBC realizou, em parceria com a Unesco, o Seminário Internacional de Mídias Públicas – Desafios e Oportunidades para o Século 21, nos dias 30 de junho e 1º de julho. Os debates de alto nível, com participação de representantes de organizações como National Public Radio, Global Forum for Media Development, Universidade de Palermo, Unesco Brasil, New York University, Télam e Ulan, BBC Trust e Center for Law and Democracy, contribuíram para a elaboração do Manual de Jornalismo da EBC, que traz como subtítulo o lema “Somente a verdade” e norteia os princípios do jornalismo de serviço público a ser feito pela empresa.
O documento foi aprovado como a Norma 801 em 2012 e abre a EBC à participação da sociedade. Foi construído de forma coletiva, com a participação de jornalistas de todos os veículos da empresa e consultores externos, além do Conselho Curador. O texto orienta dar prioridade aos direitos humanos e minorias, mostrando histórias e dando voz a quem não tem espaço na mídia comercial. Por outro lado, são vedadas a objetificação da mulher, a exploração da desgraça alheia e o sensacionalismo.
A norma traz como anexo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) e a Declaração da Unesco sobre as mídias, além da lei de criação e dos marcos normativos da comunicação e dos direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988.
Links:
Fonte: EBC
Em meio à crise política que levou ao impedimento da presidenta Dilma Rousseff, a EBC passou por momentos de tentativas de avanço em direção à consolidação do projeto de comunicação pública no país.
Antes do início da crise, o decreto nº 7.932, de 19 de fevereiro de 2013, modifica o Estatuto Social da EBC para incluir um representante dos empregados no Conselho de Administração da empresa, dando aos funcionários um espaço de participação na gestão da EBC.
Em agosto de 2015, o Conselho Curador reuniu no Seminário Modelo Institucional da EBC: balanços e perspectivas especialistas e a sociedade civil para discutir os rumos da empresa. As propostas para aumentar a autonomia da EBC frente ao governo federal incluíram: diferenciação visual e estrutural da EBC Serviços, responsável pelos governamentais TV NBR e Voz do Brasil; ampliar o debate sobre comunicação pública com a sociedade; incluir a participação social na escolha do diretor-presidente; definir critérios para ocupação de cargos por funcionários do quadro; impor uma quarentena para ex-ocupantes de cargos comissionados na Secom serem alocados na EBC, evitando assim a porta-giratória entre o órgão de comunicação do governo e a empresa pública; desvincular a EBC da Secom, aparecendo propostas da empresa ir para o Ministério da Cultura, da Educação ou mesmo uma Fundação independente.
Links:
Confira aqui a sistematização das propostas apresentadas no Seminário
Fonte: EBC, Conselho Curador e Legislação
No início de 2016, com o agravamento da crise política que culminou no impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, os conselheiros expuseram ao então ministro da Secom, Edinho Silva, na reunião do Conselho Curador do dia 24 de fevereiro, a preocupação com a autonomia da empresa, a falta de investimento e a ingerência do governo. Edinho afirmou que a decisão de criar a EBC foi política, que o projeto ainda estava se consolidando e que havia compromisso do governo com a comunicação pública, tanto que o Executivo estava disposto a mediar acordos, como o que levou à transmissão do Desfile das Campeãs do Carnaval do Rio de Janeiro, que rendeu sete pontos de audiência.
Na reunião dos dias 18 e 19 de abril de 2016 do Conselho Curador, imediatamente subsequentes à votação da admissibilidade do impeachment de Dilma na Câmara dos Deputados, os conselheiros colocaram que a TV Brasil parecia tender a cobertura demais para o lado do governo, enquanto a Agência Brasil parecia ir na direção oposta. A principal preocupação era com as intervenções feitas pelos comentaristas. O então diretor de jornalismo, Ricardo Melo, afirmou que a TV Brasil ficou mais de 10 horas no ar com manifestações pró-impeachment e que debatedores favoráveis ao impedimento da presidenta foram convidados para participar dos programas, mas não compareceram. Melo afirmou que, com a cobertura ampla das manifestações contrárias ao impeachment, a EBC cumpria a função de complementar a mídia comercial, que não mostrava esses atos. Houve também manifestações à Ouvidoria de público favorável à cobertura, colocando a TV Brasil como um contraponto à mídia hegemônica.
A presidenta do Conselho Curador, Rita Freire, em artigo na revista Socicom Debate, relata os momentos de tensão nos bastidores da empresa.
“A EBC acabava de sair de um quadro de instabilidade iniciado alguns meses antes, com o inesperado pedido de exoneração pelo então presidente da empresa, Américo Martins. Especulações sobre os motivos, atribuídos pela imprensa a intervenções indevidas do governo, e a demora na nomeação de substituto, geraram tensões e desconfiança. O Conselho Curador precisou lidar com aquela fase, chamando o governo a dar explicações, invocando o cumprimento do Plano de Trabalho Anual, ainda sob ajustes, e cobrando as providências para uma transição rápida”.
A disputa política sobre a EBC se intensificou e o desejo de controle sobre a empresa por parte do governo ficou claro com as ações seguintes. Após a votação no Senado, em 12 de maio, que aprovou a abertura do processo e afastou Dilma da presidência temporariamente, no dia 17 de maio o então presidente interino Michel Temer exonera o diretor-presidente da EBC, Ricardo Melo, recém empossado, colocando em seu lugar Laerte Rímoli. Porém, como a lei 11.652 garantia o mandato de quatro anos, Melo conseguiu uma liminar no Supremo Tribunal Federal e retomou a presidência da EBC no dia 3 de junho, ficando Rímoli também no cargo, mas sem exercer as funções.
Com o impedimento definitivo de Dilma, aprovado no Senado em 31 de agosto, no dia 1º de setembro é editada a Medida Provisória 744, que desfigura completamente o caráter público da EBC, retirando o mandato do diretor-presidente, extinguindo o Conselho Curador e vinculando a empresa diretamente à Casa Civil da Presidência da República. Com isso, o ministro do STF Dias Tóffoli suspendeu a liminar concedida a Melo, por perda de objeto, e Rímoli reassume a presidência da EBC. Nesse meio tempo, ocorreram dezenas de demissões de pessoas que ocupavam funções comissionadas e vários programas foram retirados do ar de um dia para o outro, sem aviso prévio aos espectadores e ouvintes, com a demissão dos comentaristas e apresentadores. A situação é explicitada por Freire.
“Após a troca de comando na EBC, a TV Brasil, carro-chefe da empresa, colecionou programas cortados ou inviabilizados pelos contratos suspensos, apresentando buracos difíceis de preencher de uma hora para outra. O Conselho de Administração recusou novas contratações ou renovações. Chegou a determinar meta de déficit zero até o final do ano de 2016, mesmo com recursos bloqueados e pagamentos retidos pelo governo”.
Na Exposição de Motivos nº 121/2016, que subsidia a publicação da MP 744, com data de 3 de agosto, quase um mês antes da publicação da medida, consta que “a extinção do Conselho Curador deve-se à necessidade de agilizar as decisões no âmbito da EBC, em observância ao princípio da eficiência”. O texto também justifica a vinculação à Casa Civil por causa da extinção de Secom e que “a estabilidade do mandato [do diretor-presidente] não é adequada ao exercício de empresa, mas sim à qualidade do exercício da atividade”.
Em nota, o Conselho Curador, cujos integrantes estava em Brasília para uma reunião no dia em que foram cassados, se manifestou em uma moção de repúdio, afirmando que a MP “é uma afronta aos princípios constitucionais que estabelecem a comunicação pública como um direito da sociedade brasileira”, além de tirar “a autonomia da EBC em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão e agências”. Também se manifestaram contrários à MP 744 a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, o relator especial das Nações Unidas sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, David Kaye, e o relator especial interamericano para a Liberdade de Expressão, Edison Lanza, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), além de entidades nacionais como o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), a Associação Brasileira de Emissoras Públicas Educativas e Culturais (Abepec) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).
A MP 744 foi convertida na lei nº 13.417, de 1º de março de 2017 e no dia 29 de agosto do mesmo ano a Câmara dos Deputados manteve todos os vetos presidenciais às mudanças que o próprio Congresso aprovou, na tentativa de salvar na lei um pouco do que restava de comunicação pública na EBC. Tinham sido colocados pelos legisladores uma sabatina no Senado para aprovar o nome do diretor-presidente da empresa e estabelecido um Comitê Editorial consultivo e deliberativo, para substituir o Conselho Curador, com algumas funções como debater sobre os planos editoriais e sobre conteúdos da empresa. O veto retirou a sabatina e deixou o Comitê com funções meramente figurativas, quais sejam: “propor a ampliação de espaço, no âmbito da programação, para pautas sobre o papel e a importância da mídia pública no contexto brasileiro”; e “formular mecanismo que permita a aferição permanente sobre a tipificação da audiência da EBC, mediante a construção de indicadores e métricas consentâneos com a natureza e os objetivos da radiodifusão pública, considerando as peculiaridades da recepção dos sinais e as diferenças regionais”. Os membros foram reduzidos pela metade, para 11 integrantes, e foi determinado que as reuniões ordinárias seriam mensais. Porém, mesmo figurativo, até o fim de 2019 o Comitê não foi implementado. Além disso, a empresa desmobilizou na mesma época o Comitê Editorial, que era composto por jornalistas dos diversos veículos da EBC para discutir a cobertura.
O decreto nº 9.038, de 26 de abril de 2017, coloca a EBC como entidade vinculada à Secretaria Geral da Presidência da República, por meio da Secretaria Especial de Comunicação Social e esta passa a exercer a “supervisão direta das atividades da EBC”. O projeto da ampliação da cobertura em sinal Digital da multiprogramação da TV Brasil com os canais do Poder Executivo também foi descontinuado pelo governo Michel Temer, bem como o projeto de correspondentes foi encerrado arbitrariamente em agosto de 2017 .
Links:
Fonte: Freire, EBC, Conselho Curador, Um Bom Conselho e Legislação
Em meio à crise política e às ameaças de privatização ou extinção da EBC, a sociedade civil lança a Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública e a campanha #FicaEBC. São trabalhadores da empresa, professores, pesquisadores, jornalistas, sindicatos e diversas entidades da sociedade civil na luta pela permanência da EBC como uma empresa de comunicação pública com relevância para o país.
São feitos diversos materiais de divulgação e a campanha ganha a adesão de personalidades como Tico Santa Cruz, Gregório Duvivier, Zico, Laerte Coutinho, Sérgio Mamberti, Leci Brandão, Matheus Nachtergaele e Tonico Pereira.
Em 2021, com a inclusão da EBC no Programa Nacional de Desestatização, a campanha #FicaEBC é retomada com força e mais apoios, como de Bete Mendes, Dira Paes, Osmar Prado, Natália Lage, Elza Soares, Babu Santana, Zeca Baleiro, Pedro Luis, Liniker e BNegão.
Os objetivos da Frente e da campanha são ampliar a discussão sobre a comunicação pública e divulgar a importância da EBC para a sociedade brasileira dentro de um ambiente democrático.
Fonte: #FicaEBC
A EBC lançou e efetivou entre 2017 e 2018 dois Planos de Demissão Voluntária (PDVs), para diminuir o pessoal nos quadros efetivos da empresa. O primeiro PDV foi lançado em dezembro de 2017 e finalizado em março de 2018, sendo direcionado apenas a empregados a partir de 53 anos de idade e pelo menos 10 anos de exercício na EBC. O PDV I teve a adesão de 96 trabalhadores.
O PDV II foi lançado em novembro de 2018 e finalizado em dezembro. Dessa vez, o programa foi aberto a todos os funcionários, sem limite de idade ou de tempo de casa, alcançando a adesão de 253 pessoas. O relatório anual de gestão aponta que a “economia” gerada com o corte na folha de pagamento é de R$ 67 milhões por ano.
Segundo Mayara Paixão, as reduções por meio dos PDVs e das dezenas de demissões de cargos comissionados, que são de livre nomeação, levaram a uma diminuição de 24% do quadro de trabalhadores da EBC entre 2016 e 2020. Sem concurso público para substituir os funcionários que saíram, o desmonte não é apenas de infraestrutura, mas nos quadros de pessoal também.
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Fonte: Mayara Paixão (2021) e EBC
Diante do agravamento dos casos de censura e do governismo que se abateu sobre os veículos públicos, a Comissão de Empregados da EBC e os sindicatos dos jornalistas e dos radialistas das cidades onde a empresa tem praça, começaram a organizar dossiês para relatar o desvirtuamento na missão pública da EBC e fazer o registro histórico das intervenções.
O primeiro dossiê foi lançado em agosto de 2018 e contabilizou 61 denúncias de censura e governismo ocorridas entre o mês de outubro de 2016 e a terceira semana de julho de 2018, em todos os veículos da EBC (Rádios, TV e Agência Brasil) e em todas as praças (Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo).
O destaque foi para a censura à cobertura da intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro e ao assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Pedro Gomes, além do contrato ilegal com a Agência Nacional de Águas (ANA) para a cobertura, pelos veículos públicos, do Fórum Mundial da Água.
O segundo Dossiê da Censura, lançado em setembro de 2020, contabilizou 138 denúncias, de casos ocorridos de janeiro de 2019 e julho de 2020, uma média de duas intervenções por semana. O documento levou como subtítulo “Inciso VIII”, que se refere ao artigo 2° da Lei nº11.652, de criação da EBC, que descreve os princípios a serem seguidos pela empresa de comunicação pública: “VIII - autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão”.
“O documento destaca casos em que houve cerceamento à liberdade de imprensa na empresa, gerando entraves ao cumprimento do princípio básico da instituição, que é produzir conteúdos de comunicação pública, voltados para o interesse da sociedade e que “contribuam para o desenvolvimento da consciência crítica das pessoas”, como consta na própria missão da EBC” (2º Dossiê Censura EBC).
Alguns dos destaques do segundo levantamento foram a censura às palavras ditadura e golpe, para se referir ao período iniciado com o golpe de 1964, e outras pautas de direitos humanos. Foram contabilizados apenas casos concretos denunciados, mas o número é muito maior, já que o medo de perseguição leva muitos colegas a não registrarem as censuras sofridas.
“As editorias mais censuradas foram Política e Direitos Humanos, com supressão de coberturas como as repercussões do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes e violação dos direitos indígenas, interdição de usar como fonte para matérias entidades como Anistia Internacional e Human Rights Watch e proteção excessiva a ministros e ao próprio presidente da república, com edição de falas para minimizar a gravidade de declarações oficiais” (2º Dossiê Censura EBC).
Esse segundo levantamento ganhou destaque no Relatório da Violência contra Jornalistas da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), lançado em janeiro de 2021, que dedicou uma seção de seu trabalho anual para a EBC:
https://fenaj.org.br/wp-content/uploads/2021/01/relatorio_fenaj_2020.pdf
O terceiro dossiê será lançado ainda em setembro e contabiliza 245 denúncias em um ano de registros, de agosto de 2020 a julho de 2021. O levantamento foi dividido em duas partes, uma para censura, com 156 casos de matérias modificadas, cortadas, derrubadas ou pautas que não saíram do papel e 89 registros de governismo, que é quando matérias jornalísticas ou programas fazem propaganda sem questionamento de atos ou figuras do governo.
Fonte: Mayara Paixão (2021) e EBC
A Medida Provisória nº 980, de 10 de junho de 2020, recria o Ministério das Comunicações (MCom), ao qual é vinculada a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República e, por consequência, a EBC.
A MP foi aprovada na Câmara dos Deputados no dia 21 de setembro de 2020 e no Senado apenas dois dias depois. O texto foi sancionado no dia 14 de outubro, como Lei nº 14.074.
Já em 13 de julho de 2021 é publicado o decreto nº 10.747, que “aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério das Comunicações, remaneja e transforma cargos em comissão e funções de confiança e dá outras providências”.
O texto coloca a Secretaria Especial de Comunicação Social como um dos órgãos específicos singulares do MCom e Empresa Brasil de Comunicação como entidade vinculada.
Decreto nº 10.354, de 21 de maio de 2020, qualifica a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), “de modo a possibilitar a realização de estudos e a avaliação de alternativas de parceria com a iniciativa privada”. Isso abre a possibilidade para que a empresa seja privatizada ou extinta.
Em dezembro de 2020, a Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública lançou o projeto da Ouvidoria Cidadã da EBC junto com o primeiro relatório do órgão da Sociedade civil. A ideia é retomar o controle social extirpado da empresa.
A Ouvidoria Cidadã da EBC analisa conteúdos publicados e veiculados pelos veículos públicos da Empresa Brasil de Comunicação, com o olhar dos princípios da comunicação pública, que deveriam orientar a produção da TV Brasil, das rádios Nacional e MEC, da Agência Brasil e da Radioagência Nacional, bem como os perfis desses veículos nas redes sociais.
“A criação da Ouvidoria Cidadã da EBC se faz necessária diante da cassação do Conselho Curador, em 2016, e da transformação da Ouvidoria da EBC em aparato de comunicação institucional, em 2018, que deixou de exercer a análise crítica dos conteúdos e não zela pela aplicação da lei pela empresa” (Ouvidoria Cidadã da EBC).
O site da Ouvidoria paralela da EBC foi colocado no ar em março de 2021.
Fonte: Ouvidoria Cidadã da EBC
No dia 10 de março de 2021 a secretária Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do Ministério da Economia, Martha Seillier, anunciou a inclusão da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) no Programa Nacional de Desestatização (PND).
O fato é concretizado com a publicação do decreto nº 10.669, de 8 de abril de 2021, que “dispõe sobre a inclusão da Empresa Brasil de Comunicação no Programa Nacional de Desestatização”.
Fonte: Ouvidoria Cidadã da EBC